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DIÁRIO SECRETO DE UM DISCÍPULO


Diário Secreto de um Discípulo - Vicente Beltrán Anglada

CAPÍTULO XIII

A SEGUNDA VISITA

Utilizando meios parecidos, um dia o Irmão R. me conduziu novamente ante o Mestre. Desta feita não ia conosco o Anjo que nos havia acompanhado da primeira vez, pois estava cumprindo a missão de observador e de guia espiritual sobre outra pessoa, um reconhecido discípulo que, naqueles momentos, estava atravessando uma crise muito intensa em sua vida pessoal e precisava de ajuda. 

Mas desta vez o salão onde nos recebeu o Mestre da primeira vez estava cheio de discípulos e de Irmãos espirituais. Naquela ocasião o Mestre se limitou a apresentar-me àqueles Irmãos de grupo com os quais deveria ter estreita relação durante minha permanência no Ashram. Seu contato fortaleceu a minha fé e confiança espiritual e reforçou meu propósito interno. Havia pessoas jovens e também de idade mediana e alguns anciãos. Estavam vestidos de maneira normal ou corrente, à europeia alguns, enquanto outros se vestiam à maneira oriental, com seus turbantes e vestimentas clássicas.

Não se tratava, portanto, de uma congregação hierárquica na qual os discípulos ostentam umas túnicas brancas com certos adornos dourados, cuja profusão e resplendor indicam o grau iniciático alcançado na "Senda dos Mistérios".

Depois de me apresentar àqueles que a partir desses momentos seriam meus Irmãos de grupo, o Mestre determinou que formassem um círculo ao redor d’Ele e de mim e então, adotando uma atitude séria e cheia de nobre dignidade, me olhou fixamente e tomando-me pelos ombros me perguntou simplesmente: "Queres ser um dos nossos? Não é necessário que o jures, basta que o afirmes do fundo do coração". "Ser dos nossos" envolvia a dupla alternativa de ter acesso ao Seu Ashram e de estar nobremente disposto a trabalhar para a glória da Grande Fraternidade Branca, ou Hierarquia espiritual planetária. Assim intuí claramente desde o momento em que o Mestre me formulou a pergunta. Cheio de uma indizível emoção, ainda que também de um tremendo dinamismo espiritual que surgia do mais íntimo do meu ser, respondi sem vacilar: "Sim, quero e rogo aos meus companheiros de grupo que me ajudem se me virem fraquejar". O Mestre me abraçou então e reuniu comigo três daqueles benditos Irmãos, todos de idade mediana, sugerindo-lhes que nos primeiros tempos do meu ingresso no Ashram, cuidassem de mim e me oferecessem ajuda, caso dela necessitasse: "É um Irmão muito jovem e embora no passado já tenha trabalhado muito para NÓS, necessita de certos reajustes em sua vida cármica". Todos assentiram de muito bom grado e depois de abraçar-me fraternalmente, despediram-se do Mestre. Todos os Irmãos presentes fizeram o mesmo, despediram-se afavelmente de mim e reverentemente do Mestre.

Meu grande Irmão R. aguardava enquanto o Mestre me despedia, para levar-me à "minha casa", quer dizer, ao meu corpo, sendo este termo utilizado tipicamente pelo discípulo que, por ter saído do corpo físico para uma missão especial, retorna ao mesmo depois de havê-la cumprido.

A despedida do Mestre não podia ser mais amável e cordial. Abraçando- me e me olhando fixamente como sabia fazer para que Sua consciência "penetrasse" na nossa, me disse: "Vai-te em paz. Tardarás um tempo em voltar aqui, pois necessitas verificar certos reajustes em tua existência cármica, mas na resolução dos mesmos serás diretamente ajudado pelos três Irmãos a quem te apresentei, cuja experiência espiritual é uma garantia de êxito no trabalho que lhes encomendei. Procura ser forte ante a adversidade, indulgente para aqueles que não te compreendam - dentro e fora da família - e ativo na resolução dos teus problemas cármicos. Continua escrevendo pequenos artigos falando daquelas coisas que tu pressentes. Trata de dar-lhes forma e de torná-las compreensíveis para os demais. Asseguro-te um êxito promissor a esse respeito e posso dizer que espero muito de ti para o futuro. Deverás escrever muito e sobre temas variados, ainda que adaptando-se sempre à ordem da Grande Fraternidade Branca, em cujas fileiras irás penetrando pouco a pouco, à medida que vás estudando, trabalhando e servindo. És um Discípulo aceito e ainda que somente um débil raminho da Grande Árvore da Fraternidade, estás unido à mesma pela solidez espiritual do teu propósito, cuja finalidade é o destino que guia os Grandes Seres. Esta união te dará muita força para resistir à tremenda precipitação cármica sobre tua vida; tal força é evocada sempre que se intensifica o propósito interno. Vai-te em paz, repito, e mantém-te sereno, preparado e vigilante".

A volta para "casa" se realizou sem novidades. O Irmão R. me felicitou pelo que o Mestre me havia dito e me disse ao despedir-se de mim: "Ficarás um tempo sem me ver, mas nem por isso deixarei de estar contigo. Deverás permanecer um tempo só, sem contar aparentemente com ajuda alguma, mas tem confiança, pois estás unido a nós por laços mais fortes que os da família e dos afetos mais profundos. Estás unido a nós pelas sagradas leis da Fraternidade do Coração. Adeus e permanece na Paz do Mestre".


CAPÍTULO XIV

A TERCEIRA VISITA

Alguns anos depois realizou-se minha terceira visita ao lar do Mestre. Durante todo este tempo foram se projetando sobre a minha vida pessoal grandes acontecimentos cármicos, os mais importantes talvez da minha existência pessoal, aqueles que me precipitaram abertamente na guerra civil espanhola, lutando ardentemente pela República, tão selvagem e indignamente ultrajada pelas forças ultraconservadoras do país e pelas potências do mal encarnadas nos países fascistas totalitários da Europa. Não é minha intenção introduzir detalhes pessoais relativos àqueles feitos e às suas posteriores consequências, a derrota do exército republicano e a prisão de todas as pessoas que, de uma maneira ou de outra, política, militar, ou socialmente havíamos participado da guerra civil a favor da República espanhola. Estas coisas pertencem à história e é a história que deve julgá-las. Eu devo me limitar a explicar a experiência espiritual obtida daqueles feitos e elevar-me muito na escala dos valores espirituais para não me sentir inclinado ao julgamento daqueles acontecimentos vitais que precipitaram a guerra mundial no ano de 1939, o mesmo em que se consumou a derrota da República democraticamente estabelecida na Espanha.

Ausente de todo julgamento, mas amparado pela justiça da experiência espiritual acumulada durante quase nove anos de guerra e prisão, voltei um dia a encontrar-me frente a frente com meu Mestre. Encontrei-me ali sem ter noção da "viagem", como se houvesse sido transportado através de um raio de luz, em tal caso "um raio de luz do Ashram" imposto pelas novas circunstâncias espirituais e talvez também pela limpeza que uma série de sofrimentos e de lutas contra a adversidade havia incorporado ao meu corpo etérico. Só posso dizer que desde aquele dia "a viagem" - à casa do Mestre ou a outros lugares de serviço - se realiza desta maneira, salvo algumas exceções.
Encontrei-me sozinho frente a ELE com a trêmula emoção espiritual, indefinível, de voltar "conscientemente" ao Ashram depois de tanto tempo de angústia e sofrimento em que percorri o obrigatório trajeto daquele deserto estéril, daquelas áridas e secas solidões onde a alma enfrenta o eterno dilema do Ser, enfrentando com decisão a tremenda insegurança daquelas intermináveis etapas vazias e às vezes tenebrosas nas quais o discípulo se libera, pelo sofrimento, da pele ferida e ressecada pelas ilusões perdidas e pelos afetos vãos e efêmeros. Sim, aqueles anos foram a mortalha com que enterrei a comiseração para comigo mesmo e a segurança egoísta da própria sobrevivência.

O rosto do Mestre, como sempre, refletia a eterna luz de amor e de compreensão, que como farol de suprema esperança eu havia invocado nos momentos mais difíceis e nos instantes mais dolorosos. Estava sozinho com ELE e nesta ocasião, depois de me transmitir a Sua benção, que me encheu de contentamento, limitou-se a me dizer: "Vês, já estás de novo aqui. As provas foram duras mas produziram o êxito esperado, e isto te honra porque em nenhum momento as repeliste. Após a prova decisiva, depois do ato de entrega de tua vontade ao Ashram, no qual te admiti serenamente em Meu coração, vais penetrar definitivamente na corrente iniciática, uma corrente de Vida cósmica da qual, mediante o cultivo da serena expectativa, já não se retorna". Olhou-me afetuosamente e continuou: "Estás preparado agora para tomar parte na Obra designada a este Ashram pelo Senhor Bodhisattva. Tens uns inestimáveis dotes pessoais que são um reflexo de experiências frutíferas do passado que te serão muito úteis nos momentos atuais. De acordo com as novas disposições decretadas pelo Grande Senhor Sanat Kumara, vais recuperar o melhor daquelas experiências do passado e dos conhecimentos ocultos adquiridos para "vertê-los” nos novos canais que a Grande Fraternidade abriu para o serviço da humanidade dos nossos dias. Teu único cuidado é permanecer "serenamente expectante”, quer dizer, muito atento e sem impaciência alguma. Assim irás recuperando o melhor do teu passado para precipitá-lo na ocorrência dos momentos atuais. Para ajudar-te neste labor de levar teu passado ao presente para fins de serviço, serás ajudado "telepaticamente”. A técnica da incorporação virá como efeito de um processo sincrônico. Através dela, te será fácil escrever uns livros que refletirão momentos estelares da tua própria vida e relatarão certos feitos da Grande Fraternidade que praticamente - e por disposição hierárquica - tiveram que permanecer ocultos até estes momentos. Continua, pois, escrevendo, já que escrever - no sentido que o fazes - é uma forma muito positiva de meditar e de te pôr em contato, "através dos registros akáshicos”, com os conhecimentos ocultos que estão impressos ali pelos Senhores do Tempo. Voltarás muito em breve aqui, pois quero te facilitar algumas instruções que te serão muito úteis no decorrer do teu processo espiritual. Estas instruções fazem parte de algumas transcendentes disposições do Senhor do Mundo para esta época e todos os Ashrams da Grande Fraternidade mobilizaram suas forças para lhes dar cumprimento. Vai-te, pois, em PAZ e continua trabalhando”. E me despediu como costumava fazer com todos os Irmãos: com um solene ato de benção espiritual.

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