Livros de Alice Bailey
OS TRABALHOS DE HÉRCULES
º Trabalho
Colheita dos Pomos de Ouro de Hespérides - Parte II
(Gêmeos, 21 de maio - 20 de junho)
O Campo do Trabalho
Há em Gêmeos duas estrelas, chamadas pelos gregos, Castor e Pólux, ou os Gêmeos. Elas personificam dois grupos principais de estrelas, as Sete Plêiades e as Sete Estrelas da Ursa Maior, que são as duas constelações no norte, ao redor das quais nosso universo parece girar. Castor representa uma dessas constelações e Pólux personifica a outra. Do ponto de vista do esoterismo, o grande mistério de Deus encarnado na matéria - a crucificação do Cristo cósmico na cruz de matéria - está ligado à relação (que, desde tempos imemoriais, presume-se existir) entre as estrelas das Plêiades e as da Ursa Maior. Estes dois grupos de estrelas representam Deus, o macrocosmo, enquanto que, em Gêmeos, Castor e Pólux são considerados como o símbolo do homem, o microcosmo. São também chamadas Apolo e Hércules: Apolo, significando o Governante, o Deus Sol; e Hércules, “aquele que vem para trabalhar”. Representam, portanto, os dois aspectos da natureza do homem, a alma e a personalidade, o homem espiritual e o ser humano através do qual aquela entidade espiritual está atuando: Cristo encarnado na matéria, Deus trabalhando através da forma.
Considerava-se Castor como mortal e Pólux como imortal. É interessante notar que a astronomia registra o fato de que a estrela Castor está perdendo o brilho e não mais apresenta a mesma luz de vários séculos atrás; enquanto que Pólux - o irmão imortal - cresce em brilho, ofuscando seu irmão, fazendo-nos assim recordar das palavras proferidas por João Batista ao olhar para o Cristo: “Convém que ele cresça e que eu diminua”. (João, III, 30) Assim, temos aqui uma constelação extremamente significativa, porque mantém eternamente diante dos olhos do homem o pensamento da crescente potência da vida espiritual e do decrescente poder do eu-pessoal. A história do crescimento do homem até a maturidade e a história do crescimento gradual do controle pela alma nos são relatadas na constelação de Gêmeos.
No antigo zodíaco de Dendera, este signo é chamado “o lugar d’Aquele que vem”, e nos é apresentado o pensamento de um Ser espiritual emergente. É representado por duas figuras, uma masculina e uma feminina; uma, o polo positivo, o aspecto espírito; a outra, o polo negativo, o aspecto matéria. Os nomes dessas estrelas significam “unidos” no hebraico e no cóptico e este é o status de Hércules, o aspirante. Ele é alma e corpo unificados. Este era o problema com que se tinha de lutar, no signo de Gêmeos. A unificação do eu inferior com o eu superior, dos aspectos mortal e imortal, é o objetivo. Foi este problema que criou a longa e tortuosa busca de Hércules, pois há muito estava ele atento à voz de Nereu, o eu superior, embora às vezes sucumbisse à ilusão e miragem do eu inferior.
A dualidade enfatizada no signo de Gêmeos percorre um grande número de histórias mitológicas. Deparamos com os mesmos irmãos novamente em Rômulo e Remo, por exemplo, e em Caim e Abel: um irmão morrendo e o outro vivendo. Vemos o símbolo astrológico de Gêmeos nos dois pilares da Maçonaria e muitos acreditam que, se tivéssemos poder para acompanhá-la, a tradição maçônica poderia ser rastreada até aquele período anterior à era de Touro, quando o sol estava em Gêmeos, e até aquele grande ciclo no qual a raça lemuriana - a primeira raça estritamente humana - veio à existência onde o aspecto mente começou a emergir e a dualidade do homem tomou-se um fato na natureza.
A raça humana foi a terceira raça; e este trabalho que simbolicamente Hércules executou, é o terceiro. Era a alma o que ele buscava, e tem sido sempre a não reconhecida busca do ser humano até que ele se reconheça como Hércules e comece a se concentrar na busca das maçãs de ouro da instrução e sabedoria. Assim, na tradição maçônica, está exemplificada a busca da família humana: a busca da luz, a busca da unidade, a busca da divindade. Os dois pilares - Boaz e Jachin - permanecem como símbolo dessa dualidade.
Na China, Castor e Pólux, são conhecidos como os dois “deuses da porta”, indicando o tremendo poder que o deus da matéria pode assumir, e também a potência da divindade.
Gêmeos é, predominantemente, o signo do intelecto e tem sobre a nossa raça, a ariana, peculiar efeito vital. Nesta raça a faculdade da mente e o intelecto se desenvolveram continuamente. Gêmeos, portanto, influencia três departamentos que dizem respeito às relações humanas. Primeiro, governa todos os aspectos da educação. Lida com o conhecimento, as ciências e lança as bases para a sabedoria. Nas palavras de um educador, “o fim último da educação é a aquisição do conhecimento com o fim de obter a revelação superior. Os não inteligentes podem obtê-la, mas não podem interpretá-la”. Com este trabalho, Hércules recebeu uma primordial revelação e, nas cinco etapas de sua busca, sua educação foi desenvolvida.
O governante esotérico de Gêmeos e do primeiro decanato é Mercúrio, como nos diz Alan Leo:
“No mundo exterior Mercúrio significa escolas, faculdades e todas as instituições científicas e literárias, qualquer lugar onde o ensino e o aprendizado se processe... Na consciência, significa pensamento, compreensão, razão, inteligência, intelecto; do tipo abstrato, mais do que conhecimento concreto como um fim em si mesmo... Sua mais alta aplicação parece ser o que chamamos “razão pura”... No corpo, governa o cérebro e o sistema nervoso, a língua e os órgãos da palavra, as mãos como instrumentos da inteligência.” (Alan Leo. Completo Dicionário de Astrologia, pag. 163)
Em segundo lugar, Gêmeos representa “a relação entre”. Governa, portanto, a inter-relação ou intercomunicação e o comércio. É interessante observar que os Estados Unidos e Londres são ambos governados por Gêmeos; que a língua inglesa se está tomando predominantemente uma língua universal; que as maiores linhas de comunicação marítima partem de Nova York ou de Londres, e que estas duas cidades têm sido mercados mundiais e centros mundiais de distribuição. Mercúrio, o planeta que rege este signo, é o intérprete, o mensageiro dos deuses. É também digno de nota como Hércules é influenciado por dois professores: Nereu, o instrutor superior, e Busiris, o instrutor inferior ou psíquico; e assim é novamente enfatizada a dualidade de Gêmeos e a sua qualidade mental.
Quando este signo está em evidência, como agora, sendo ele um poderoso signo de mutação, dá margem a muitas mudanças: novas ideias inundam o mundo; novos impulsos se fazem presentes; novas e ainda não desenvolvidas linhas de abordagem à verdade espiritual emergem, e muitos mestres surgirão por todos os lados para ajudar a guiar a raça para um novo estado de percepção espiritual. Sendo um signo do ar, vemos que a conquista do esforço aéreo prossegue velozmente, assim como um constante esforço é feito para unificar e coordenar os muitos e variados aspectos do esforço humano.
Vênus é o regente esotérico de Gêmeos e governa o segundo decanato; pois Vênus faz a união, e através de sua influência a lei de atração e a aproximação das polaridades opostas têm lugar. Mas todas estas mudanças e unificações naturalmente inauguram um novo estado de percepção, um novo estado de ser, e produzem uma nova era e um mundo novo. Em consequência, novas dificuldades e problemas surgem e encontramos Saturno governando o último decanato, pois Saturno é o planeta do discipulado; o planeta que faz surgirem as dificuldades, problemas e provas que oferecem ao discípulo a imediata oportunidade. É Saturno que abre a porta à encarnação, e é Saturno que abre a porta para o caminho da iniciação. Mercúrio - o intérprete, o intelecto que ilumina; Vênus - o princípio da atração e unificação; e Saturno - o gerador da oportunidade; estes três desempenham seus papéis na vida do aspirante enquanto ele unifica o superior e o inferior, passa pelas cinco etapas da sua prova e visualiza a meta que ele tem que atingir finalmente.
As Três Constelações Simbólicas
As três constelações que se encontram em conexão com o signo de Gêmeos são Lepus, a Lebre; Canis Major, Cão Maior; e Canis Minor, Cão Menor. E em sua inter-relação e em sua associação com Hércules, o aspirante, encontramos mais uma vez descrita de forma notável toda a história do ser humano. Em Canis Major encontramos Sírio, a Estrela do Cão, em muitos livros antigos chamada “a líder de todas as hostes celestiais”, pois ela é dez ou doze vezes mais brilhante do que qualquer outra estrela de primeira magnitude. Sírio esteve sempre associada a grande calor; daí a expressão canícula (“dias de cão”) quando o calor atinge o máximo, no meio do verão. Do ponto de vista ocultista, Sírio tem profundo significado. “Nosso Deus é um fogo consumidor”, e Sírio é o símbolo da alma universal assim como da alma individual. Por isso é considerada, esotericamente, a estrela da iniciação. Sabemos que, falando simbolicamente, chega um momento em que a estrela brilha diante do iniciado, significando a compreensão de sua identidade com a alma universal, e isto ele vislumbra repentinamente por meio de sua própria alma, sua própria estrela.
Canis Major é o imortal Mastim dos Céus, aquele que eternamente caça o Cão menor, o “pobre coitado”, o homem em encarnação física. Esta caçada foi imortalizada por Francis Thompson em “O Mastim do Céu”.
“Fugi d’Ele, dias e noites;
Fugi d’Ele, ao longo das arcadas dos anos;
Fugi d’Ele, descendo o labirinto dos caminhos
De minha própria mente; em meio às lágrimas, e às risadas, escondi-me
d’Ele.
Corri para as esperanças avistadas;
E desci velozmente, precipitando-me
Para as titânicas sombras de medos abissais,
Fugindo dos poderosos pés que me seguiam, seguiam”.
No zodíaco de Dendera, esta estrela é chamada Apes, a cabeça. Somos informados (no apêndice, pag. 1518, da Bíblia do Companheiro) que a mais brilhante estrela em Canis Major é Sírio, o Príncipe, chamado em persa o Líder, o Chefe. Há três outras estrelas nessa mesma constelação: uma é chamada “a anunciadora”, outra, “a que brilha”, e a terceira, “a gloriosa”, todas essas expressões enfatizando a magnificência de Canis Major e, esotericamente, a maravilha e a glória do seu superior.
Em Canis Minor, o “pobre coitado”, a mesma obra nos diz que o nome da estrela mais brilhante significa “redentora”, que a segunda em brilho é “a carregadora do fardo” ou “a que carrega o fardo dos outros”. Temos, pois no significado destes dois nomes um retrato de Hércules, ao trabalhar por sua própria salvação e ao carregar o pesado fardo de Atlas e aprender o significado do serviço.
Lepus, a Lebre, associada a estas duas constelações, contém uma estrela de profunda tonalidade escarlate, quase como uma gota de sangue. Vermelho é sempre o símbolo do desejo por coisas materiais. No zodíaco de Dendera dão-lhe o nome de Bashtibeki, que significa “caindo em confusão”. Aratus, escrevendo por volta de 250 A.C., fala de Lepus como sendo “eternamente caçada”, e é interessante notar que os nomes hebraicos de algumas das estrelas encontradas nesta constelação, significam “o inimigo d”Aquele Que Vem”, que é o significado do nome da estrela mais brilhante, Arneb; enquanto três outras estrelas têm nomes que significam “o louco”, “o confinado”, “o enganador”. Todas estas palavras são características do eu inferior eternamente caçado pelo eu superior; a alma humana perseguida pelo Mastim do Céu.
Ao olharmos à noite para o céu estrelado e localizamos Sírio, a Estrela do Cão, a história do nosso passado, presente e futuro está ali dramaticamente retratada. Temos a história de nosso passado em Lepus, a Lebre, de pés ligeiros, enganada, enlouquecida, aprisionada à roda da vida, identificada com o aspecto matéria, eterna inimiga do “Príncipe Que Vem”. Em Canis Minor, temos a história do aspirante, do nosso quinhão atual. Habitando dentro de nós está o governante interno, a divindade oculta, o redentor. Avançamos conquistando e para conquistar, mas temos que fazê-lo como discípulos carregando o fardo dos demais e servindo. Em Canis Major está retratado o nosso futuro e uma consumação gloriosa muito além de todas as realizações presentes.
Supondo que perdêssemos todas as religiões e escrituras mundiais desaparecessem e nada mais restasse a não ser os céus estrelados, a história do zodíaco e o significado dos nomes das estrelas encontradas nas diferentes constelações nos permitiriam reconstruir a história do homem, recuperar o conhecimento da nossa meta e aprender o modo de alcançá-la.
A Lição do Trabalho
Toda esta história significa realmente a primeira lição que todos os aspirantes têm que aprender a dominar, o que é impossível sem haverem passado pelas provas em Carneiro e em Touro. Então, no plano físico, no campo do cérebro e em consciência vigil, o discípulo tem que registrar o contato com a alma e reconhecer-lhe as qualidades. Ele não mais pode ser o visionário místico, mas tem que somar à realização mística o conhecimento oculto da realidade. Os aspirantes frequentemente esquecem-se disto. Contentam-se com a aspiração e com a visão da meta celestial. Eles forjaram no crisol da vida um equipamento que é caracterizado pela sinceridade, desejo bom, caráter refinado e têm consciência da pureza do motivo, uma disposição para cumprir as exigências, e a satisfação de terem alcançado um certo status de desenvolvimento que lhes permite prosseguir. Mas falta ainda uma coisa: eles não possuem aquilo que pode ser chamado “a técnica da presença”; eles não têm o privilégio e prerrogativa para possuir. Eles acreditam no fato da alma, na possibilidade da perfeição, no caminho que deve ser trilhado; porém esse “acreditar” ainda não foi transmutado em conhecimento do reino espiritual e eles não sabem como chegar à noite! Assim, eles, tal como Hércules, começam uma busca quíntupla.
A primeira etapa dessa busca estaria repleta de encorajamento para eles, fossem eles capazes de reconhecê-lo. Tal como Hércules, eles encontram Nereu, o símbolo do eu superior; e mais adiante na história do discípulo, Nereu é o Mestre instrutor. Quando contatado, especialmente nas primeiras etapas da busca, o eu superior manifesta-se como um lampejo de iluminação, e eis que desaparece! Ele se foi como um súbito vislumbre da verdade, tão fugaz que, a princípio, o discípulo não consegue apreendê-la; é como um indício sugestivo lançado na consciência em momentos de atenção concentrada, quando se consegue estabilizar a mente e, temporariamente, as emoções deixam de controlar.
No caso de um discípulo mais avançado que já estabeleceu contato com sua alma e que, portanto, supõe-se esteja pronto para a instrução de um dos grandes Mestres da Humanidade, ver-se-á que o Mestre age exatamente como Nereu. Ele não pode ser sempre contatado, e apenas ocasionalmente poderá o discípulo entrar em contato com ele. Quando o faz, ele não precisa esperar pelas congratulações por seu maravilhoso progresso, nem encontrará uma elucidação cuidadosa de seu problema, nem uma extensa descrição do trabalho a ser feito. O Mestre lhe dará um indício e desaparecerá. Fará uma sugestão e nada mais dirá. Cabe ao discípulo seguir a pista da melhor maneira que possa e seguir a sugestão que lhe parecer mais sábia.
Muitos ocultistas bem intencionados nos levariam a crer que os Mestres de Sabedoria têm um interesse pessoal neles, que os sobrecarregados Guias da Humanidade nada mais têm que fazer do que dizer-lhes como viver, como resolver seus problemas e como, em detalhe, guiá-los em seus empreendimentos. Gostaria que aqui ficasse isto registrado como um protesto por subestimar-se a tal ponto o trabalho dos Grandes Seres. As razões pelas quais Nereu, o Mestre, é esquivo e dá apenas um lampejo de pensamento ou de momentânea atenção ao aspirante, são duas:
Primeira: o aspirante individual não é de interesse para o Mestre enquanto não houver alcançado em sua evolução o ponto em que está tão intimamente em contato com sua alma que se torne um magnético servidor no mundo. Então, e somente então, haverá proveito para o Mestre lançar-lhe um pensamento ou dar-lhe uma indicação. Então, à medida que essas indicações sejam seguidas, Ele poderá dar-lhe outras mais, porém, e este é o ponto que se deve enfatizar, somente em relação ao trabalho que ele tem que realizar no campo do serviço mundial. Os aspirantes precisam lembrar-se que eles se tornam mestres apenas pela mestria, e que somos ensinados a nos tornarmos mestres e levados à posição de membros do grupo de servidores do mundo pelos esforços de nossa própria alma. Essa alma é um filho divino de Deus, onisciente e onipotente. A proporção que o gêmeo imortal cresce em poder, a do irmão mortal decresce.
Segundo: os corpos físicos dos aspirantes não estão em condições de suportar a vibração aumentada de Quem conquista a Mestria. O corpo ficaria esmagado e o cérebro sobrecarregado se um dos Mestres fizesse contatos constantes com um discípulo antes que este houvesse aprendido a conhecer Nereu como o símbolo de seu próprio eu superior. Quando por nossos próprios esforços começamos a viver como almas, e quando por nosso esforço autoiniciado estamos aprendendo a servir e a ser canais para a energia espiritual, então conheceremos Nereu mais intimamente; e então, quase que inevitavelmente, nosso conhecimento do trabalho que os Grandes Seres têm que fazer será tão vital e tão real que nós esqueceremos nosso próprio desejo de contato e procuraremos somente aliviar o fardo que Eles carregam.
Ao iniciar sua busca, Hércules encontrou Nereu; porém não se sentiu impressionado e por isso vagou por outros caminhos procurando furiosamente satisfazer sua aspiração. Próximo ao fim de sua busca, encontra Atlas, carregando o fardo do mundo, e tão impressionado fica com o peso daquela responsabilidade e a carga que Atlas, o grande Mestre, está carregando, que ele esquece totalmente o seu objetivo e sua busca pelas maçãs de ouro e esforça-se para retirar o fardo dos ombros de Atlas. Quando os aspirantes no campo religioso e na Igreja, no campo teosófico, no campo rosacruciano, e nos muitos grupos em tomo dos quais gravita, tiverem aprendido a esquecerem-se de si mesmos no serviço e deixarem para trás o seu egoísmo espiritual e passarem a ajudar a humanidade, haverá uma muito mais rápida reunião de iniciados atravessando o portão do Caminho que conduz das trevas à Luz, e da irrealidade à Realidade. Um dos Grandes Seres disse “há pessoas que, sem jamais terem exibido qualquer sinal externo de egoísmo, são intensamente egoístas em sua aspiração espiritual interior” (pag.360, Cartas dos Mahatmas a A.P.Sinnett). E mais adiante o autor apresenta-nos um estupendo ideal que elimina de vez a raiz do egoísmo espiritual: “No nosso modo de ver, as mais elevadas aspirações pelo bem-estar da humanidade se tornam manchadas pelo egoísmo se na mente do filantropo se esconde a sombra do desejo de autobenefício...”
Hércules, o discípulo, conheceu o toque do eu superior, mas não o suficiente para permanecer com Nereu. Assim, volta-se para o sul, isto é, volta-se para o mundo. Teve seu grande momento quando transcendeu a consciência cerebral e conversou com sua alma. Mas isso não dura muito, e ele cai de volta em sua consciência cerebral e inicia uma nova experiência. Ele tem que lutar com Anteu, a serpente (ou gigante). Porém, desta vez é a serpente da miragem astral e não primariamente a serpente do desejo. É com as miragens do psiquismo inferior que ele tem que lutar, e estas, nas primeiras etapas, parecem inevitavelmente atrair o interesse dos aspirantes. Qualquer instrutor que tenha trabalhado com aqueles que estão procurando o Caminho, conhece a miragem da qual eles tão facilmente se podem tornar presas. De acordo com o temperamento do aspirante assim será a miragem. Alguns são desviados pelos fenômenos espíritas. No afã de atravessar o véu, deixam-se envolver pelo lado inferior do espiritualismo e perdem muito tempo nas salas de sessões estudando repetidamente o mesmo velho fenômeno da materialização, comunicações e manifestações. Não me refiro aqui às verdadeiras investigações científicas daqueles que se aprofundam nesta pesquisa, e que estão equipados para tal. Refiro-me à participação ignorante em certos tipos de sessões. Isto intriga o comum das pessoas e deixam-nas à mercê do médium igualmente ignorante, ou do charlatão, pois que um e outro não estão equipados para verificar de modo algum o que vêm e ouvem.
A serpente pode tomar a forma do aspecto mais comum dos fenômenos psíquicos. O aspirante interessa-se pela escrita automática, ou aprende a sentar-se e ouvir “vozes”; torna-se astralmente clarividente ou clariaudiente, e soma à confusão do plano físico e de seu próprio meio ambiente, a confusão ainda maior do plano psíquico, e cai assim nas armadilhas e engodos da miragem. Ele se toma negativo, porque está o tempo todo tentando ver ou ouvir aquilo que não é físico. Pelo fato de que compartilhamos com gatos e cães a capacidade da clarividência e clariaudiência, no devido tempo seguramente poderemos ver e ouvir, se não de fato, pelo menos pelo poder daquela faculdade criativa que todos nós possuímos, a imaginação criativa. Porém, de uma forma ou de outra, o aspirante que se afastou de Nereu encontrará a serpente e com ela terá que lutar. Como diz o mito, durante muito tempo Hércules não conseguiu vencê-la, porém quando a ergueu no ar, teve sucesso.
Há uma grande verdade por trás deste simbolismo. O ar foi sempre considerado o símbolo ou o elemento relacionado ao plano do Cristo, chamado na terminologia teosófica e no oriente, o plano búdico.
O plano astral é o reflexo distorcido do plano búdico, e somente quando trazemos a miragem para a clara luz da alma crística é que vemos a verdade tal como é, e nos tornamos invencíveis. Da maneira mais solene eu conclamo os aspirantes a abandonar qualquer interesse nos fenômenos psíquicos e a fechar a porta ao plano astral com tanta firmeza quanto possam, até que tenham desenvolvido o poder da intuição e possam interpretar suas intuições por meio de uma bem desenvolvida, bem equipada e bem treinada mente.
A etapa seguinte da busca de Hércules é igualmente aplicável à humanidade como um todo. Ele caiu nas garras de Busiris, que se dizia um grande mestre. Por um longo período de tempo foi Hércules mantido em escravidão. O mundo hoje está cheio de mestres, e como Busiris, eles baseiam seus ensinamentos em portentosas alegações; alegam ser iniciados, ser os guardiães da verdade, e possuir um modo certo e seguro de desenvolvimento que inevitavelmente permitirá ao estudante alcançar a meta. Eles sustentam sua posição com promessas; eles estabelecem uma forte relação pessoal, e utilizando-se da sinceridade e aspiração daquele que busca a verdade, reúnem ao seu redor grupos de homens e mulheres que inocente e sinceramente acreditam na verdade de suas alegações, e os prendem ao altar do sacrifício por um período mais ou menos longo de tempo. O verdadeiro iniciado é conhecido por sua vida e seus atos; está por demais ocupado em servir à humanidade para encontrar tempo para fazer com que as pessoas se interessem nele; e não pode fazer promessas, apenas pode dizer a cada aspirante: “Estas são as antigas regras, este é o caminho que todos os santos e Mestres de Sabedoria trilharam, esta é a disciplina a que cada um tem que submeter-se; e se cada um tentar e persistir e for paciente, seguramente alcançará a meta”.
Mas Hércules libertou-se, como o fazem todos os que buscam com sinceridade; e tendo escapado do mundo da miragem psíquica e pseudoespiritual, começou a servir. Primeiro libertou-se sob o símbolo de Prometeu, que significa Deus encarnado, livrando-o da tortura dos abutres do passado. O plexo solar, o estômago e o fígado são as exteriorizações, se assim o posso expressar, da natureza do desejo, e Hércules libertou-se dos abutres do desejo que por tanto tempo o torturavam. Deixou de ser egoísta, deixou de satisfazer a si mesmo. Recebera duas amargas lições neste signo e para este ciclo em particular estava relativamente livre. Prometeu, o Deus interno, podia agora seguir para o serviço mundial e para aliviar Atlas de seu fardo.
Depois do sacrifício vem a recompensa, e Hércules teve a sua grande surpresa depois que libertou Prometeu e Atlas. Tendo abandonado sua busca no afã de ajudar o mundo, em troca, Atlas foi ao jardim e lhe trouxe as maçãs de ouro, pondo-o em contato com as três belas virgens, os três aspectos da alma.
Ao dar início ao seu trabalho ele faz contato com sua alma, simbolizada como Nereu; ao término do trabalho, tendo vencido muitas miragens, ele conquista uma visão muito ampliada de sua alma, vendo-a em seus três aspectos, cada um contendo em si a potência dos três princípios da divindade. Aegle simboliza a glória da vida e o esplendor do sol poente; a magnificência da manifestação no plano físico. Ela oferece uma maçã a Hércules e diz-lhe: “O caminho até nós é sempre através de atos de amor”. Eriteia guarda o portão, a alma, que é sempre aberto pelo Amor-Sabedoria, e dá a Hércules uma maçã na qual está inscrita em ouro a palavra SERVIÇO. Héspero, a estrela vespertina, a estrela da iniciação, personifica a Vontade. Ela diz a Hércules: “palmilha o Caminho". Corpo, alma e espírito; Inteligência, Amor e Vontade, visualizados e contatados pelo aspirante desprendido por meio do SERVIÇO.