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Livros de Alice Bailey

Do Intelecto à Intuição


Capítulo II - O Propósito da Educação

"... a educação esta sofrendo importantes transformações. O processo, relativamente externo pela introdução dos fatos, torna-se cada vez mais um processo pelo qual são evocadas as possibilidades geradoras mais profundas, ocultas no indivíduo".
H.A. OVE RSTREET

O Propósito da Educação

Um dos numerosos fatores que conduziram a humanidade ao seu grau atual de desenvolvimento foi o crescimento e o aperfeiçoamento dos seus métodos e sistemas de educação. O ensinamento esteve primeiramente nas mãos das organizações religiosas; mas hoje em dia, já não têm praticamente o controle, que passou às mãos do Estado. No passado, a educação era largamente colorida pela teologia e os seus métodos eram ditados pelos homens da Igreja. Agora, o vasto corpo do ensino é formado pelo Estado; toda tendência religiosa é ignorada, tendo em conta as numerosas Igrejas diferenciadas, e a tendência do ensino é quase toda materialista e científica. Antigamente, no Oriente e no Ocidente, não tínhamos senão a educação dos membros mais altamente evoluídos da família humana. Hoje, temos a educação das massas. Para bem compreender a educação futura e, cremos superior, estes dois fatores devem estar presentes no espírito, porque será numa síntese dos dois métodos - educação do indivíduo e das massas, educação religiosa e científica - que se encontrará o caminho.

Como todas as coisas neste período de transição, os nossos sistemas educacionais estão num estado de flutuação e mudança. É geral um sentimento de que muito se fez para elevar o nível da mente humana, simultaneamente a uma profunda corrente de descontentamento quanto aos resultados. Põe-se em causa se os nossos sistemas de ensino estão alcançando o máximo benefício. Apreciamos o enorme avanço que foi realizado no curso dos últimos duzentos anos e, contudo, perguntamos se no fim de contas tiramos da vida tudo o que se poderia obter, das pessoas, com um sistema adequado de treino e desenvolvimento. Inflados de satisfação em virtude do crescimento do nosso saber, da acumulação das nossas informações e do controle da natureza, debatemos, contudo, a questão de saber se possuímos ou não uma verdadeira cultura. Ensinamos os nossos filhos a memorizar uma enorme soma de fatos e a assimilar uma quantidade de detalhes infinitamente diversos, e, no entanto, inquietamo-nos em saber se os ensinamos a viver mais satisfatoriamente. Despendemos milhões na construção e no equipamento das universidades e colégios e, no entanto, os nossos educadores mais clarividentes estão gravemente preocupados em saber se esta educação responde realmente às necessidades do cidadão comum. Parece falhar sua missão quanto à criança excepcional, ao homem e à mulher bem dotados. O nosso modo de desenvolvimento da juventude está decididamente em julgamento. Só o futuro mostrará o meio pelo qual a cultura do indivíduo poderá prosseguir paralelamente à civilização, pela educação das massas.

Numa época de empreendimento científico e de síntese do pensamento em todos os departamentos do conhecimento humano, um dos nossos educadores, o Dr. Rufus M. Jones diz:

"Ah! Mas nenhuma destas realizações nos faz melhores homens. Não há uma equação entre as contas de banco e a bondade do coração. O saber não é de modo algum a mesma coisa que a sabedoria e a nobreza do espírito... O mundo nunca viu antes um exército tão imenso de educadores a agir sobre a juventude do país, nem jamais aconteceu na história do mundo tal dispêndio generoso de dinheiro em favor da educação primária e superior. Contudo, o efeito total é desapontador e não alcança o ponto central. As nossas instituições de ensino produzem alguns bons "escolares" e fornecem uma massa de fatos científicos a numerosos indivíduos. Mas há uma falência lamentável na principal questão da educação que é, ou deveria ser, a formação do caráter, a cultura do espírito, a construção da alma." (1)

A Velha Mãe Ásia e a Europa, até o século XVIII, treinavam e aculturavam o indivíduo. Dava-se um treino intensificado às chamadas classes superiores e ao homem que demonstrava uma marcada aptidão para a cultura espiritual.

Sob o sistema bramânico, no Oriente, e nos monastérios do Ocidente, dava-se uma cultura especial àqueles que podiam aproveitar e produzir indivíduos excepcionais que, até hoje, puseram a sua marca no pensamento humano. O nosso mundo ocidental moderno substituiu isto pela educação das massas. Pela primeira vez milhares de homens aprendem a servir-se das suas mentes. Começam a afirmar a sua própria individualidade e a formular as suas próprias ideias. A liberdade de pensamento, a libertação do controle das teologias (religiosas ou científicas) são os gritos de guerra do presente e muito tem sido ganho. As massas começam a pensar por si próprias, mas é um pensamento da massa, e a opinião pública temerária molda o pensamento tanto como outrora as teologias. O pioneiro tem tanta dificuldade, hoje em dia, como no passado, para fazer-se sentir no mundo do pensamento e das realizações.

A grande roda da vida gira e talvez devemos voltar ao antigo método de instrução especializada em proveito do indivíduo especial; reversão que não implicará uma rejeição da educação das massas. Deste modo, talvez consigamos finalmente unificar os métodos do passado e do Oriente com os do presente e do Ocidente.

Antes de considerarmos estes dois métodos, vamos experimentar definir educação, expressar nós mesmos os seus fins e, portanto, esclarecer as nossas ideias quanto aos objetivos dos nossos esforços. Isto não é coisa fácil. A educação pode ser definida sob o aspecto menos interessante, como uma entrega de saber ao estudante e geralmente a um estudante indiferente, que recebe uma massa de informações que não lhe interessam de modo algum. Isto é árido e seco; sentimos que esta apresentação trata principalmente do desenvolvimento da memória, com a comunicação dos pretendidos fatos, dando-se ao estudante uma pequena informação sob grande número de assuntos sem correlação recíproca. Contudo, o sentido literal dá palavra é: "Conduzir para fora de..." ou "tirar de...", e isto é muito instrutivo. O pensamento latente nesta ideia é que deveríamos extrair para fora instintos e potencialidades inerentes à criança, a fim de conduzi-la de um estado de consciência até outro mais vasto. Desta maneira, conduzimos, por exemplo, as crianças que estão simplesmente conscientes de estarem vivas, a um estado de autoconsciência; tornam-se conscientes de si próprias e das relações grupais; são ensinadas a desenvolver os seus poderes e capacidades, especialmente graças à orientação profissional, a fim de se tornarem independentes economicamente e, portanto, membros da sociedade, autossubsistentes e assim capazes de socorrer às suas próprias necessidades. Exploramos o seu instinto de preservação a fim de conduzi-los ao caminho do conhecimento. Poder-se-á dizer que começamos por utilizar o seu equipamento instintivo para fazê-los entrar no caminho do intelecto? Pode ser verdade, mas pergunto se, tendo-os conduzido a este ponto, continuamos o nosso bom trabalho e ensinamos-lhes o verdadeiro significado da intelectualização como exercício pelo qual a intuição desponta. Ensinamos-lhes a utilizar os seus instintos e o seu intelecto como parte do aparelho de preservação no mundo exterior dos negócios humanos, mas o uso da razão e do controle eventual da mente pela intuição na obra de autopreservação e na continuidade da consciência nos mundos subjetivos e reais é, ainda, o saber privilegiado de um pequeno número de pioneiros. Se a definição da intuição dada pelo professor Wildon Carr é correta, então os nossos métodos educativos não tendem para o seu desenvolvimento. Ela descreve-a como sendo "a apreensão direta, pela mente, da realidade tal qual é, o não sob a forma de uma percepção ou de uma concepção, nem de uma ideia, nem de um objeto da razão, tudo o que, é apenas ainda uma apreensão intelectual." (2)

Consideramos a ciência mental ou as modificações do princípio pensante (como a chamam os hindus) como estritamente humanas, considerando as reações instintivas do homem como qualidades que possui em comum com os animais. Não será possível que a intuição, a arte da clara visão sintética, possa um dia encontrar-se em relação com o intelecto, como este se encontra, por sua vez com a faculdade instintiva?

O Dr. Dibblee de Oxford faz sobre o instinto e a intuição os seguintes interessantes comentários que têm aqui o seu lugar em função da nossa tese, a favor do reconhecimento de uma técnica conducente ao desenvolvimento de uma faculdade de consciência mais alta. Diz ele:

"Tanto o instinto como a intuição começam nas partes extraconscientes de nós mesmos, para empregar uma metáfora local, e emergem igualmente de improviso à luz da consciência quotidiana... Os impulsos do instinto e as incitações da intuição são engendradas no segredo total.

Quando aparecem, são necessariamente quase completas e a sua aparição na nossa consciência é súbita." (3)

Em outra passagem, o Dr. Dibblee acrescenta que a intuição está situada do outro lado da razão, em posição oposta ao instinto. Temos, por conseguinte, esta triplicidade interessante - o instinto, o intelecto e a intuição - com o instinto abaixo do limiar da consciência, por assim dizer, com o intelecto mantendo o primeiro lugar no reconhecimento do homem como ser humano e com a intuição situada para além dos dois, fazendo apenas ocasionalmente sentir a sua presença pelas súbitas iluminações e captações da verdade que são o dom dos nossos maiores pensadores.

Haverá com certeza no processo da educação, qualquer coisa mais do que apenas para preparar o homem, em vista da luta pela vida e da adaptação ao meio arbitrário? A humanidade deve ser conduzida para o futuro e para uma realização mais vasta e profunda. Deve ser equipada de maneira a fazer face a todas as eventualidades de modo a obter os resultados mais elevados e melhores. Os poderes dos homens devem ser conduzidos â sua plena expressão construtiva. A realização não deve ter limite padronizado que, uma vez atingido, deixe as pessoas complacentes, satisfeitas consigo mesmas e, por conseguinte, estáticas. Elas devem ser sempre conduzidas dos estágios de realização mais baixos até os mais altos, e a faculdade de conhecer deve ser expandida de maneira perseverante. A expansão e o crescimento são a lei da vida e enquanto a massa dos homens deve ser elevada por um sistema de educação suscetível de proporcionar o melhor bem ao maior número, o indivíduo deve receber sua herança plena e deve ser providenciada uma cultura especial que faça crescer e fortificar os mais perfeitos e os melhores de entre nós, porque no seu aperfeiçoamento se encontra a promessa da Nova Era. O inferior e o atrasado devem também submeter-se a um treino especial a fim de atingirem o modelo elevado que os educadores fixaram. Mas é de uma importância maior ainda, que nenhum homem com aptidão ou equipamento especial seja mantido no nível estático do modelo de massa das classes educadas:

É justamente aqui que a dificuldade de definir a educação aparece, e que as questões surgem quanto ao seu fim real e aos seus verdadeiros objetivos. O Dr. Randall bem o compreendeu num artigo em que diz:

"Desejaria recomendar a definição da educação como um exercício possível de meditação íntima. Que cada um pergunte a si próprio o que entende por "educação" e, se refletirdes profundamente sobre a questão, descobrireis que para responder a isso é preciso ir até o mais profundo do significado da própria vida. Pensar sinceramente no significado da educação, obriga-nos a confrontar as questões fundamentais da vida, como nunca antes o fizemos. Será o conhecimento o fim da educação? Sim, certamente, mas o conhecimento para que? O seu fim é o poder? Sim, ainda, mas o poder para que fim? É o seu fim o ajustamento social? A idade moderna responde enfaticamente que sim, mas que espécie de ajustamento será esse? E determinado por que ideias? Que a educação não aspira a um simples conhecimento ou a um tipo qualquer de poder mas a um conhecimento e poder usados corretamente, é claramente reconhecido pelo pensamento educacional mais progressista, ainda que não pela opinião popular de hoje...

Em consequência, o grande objetivo da nova educação é o treino e o desenvolvimento do indivíduo para fins sociais, isto é, para o mais vasto serviço do homem...

Classificamos geralmente a educação em três categorias: primária, secundária e superior. A estas três categorias desejaria acrescentar uma quarta. Esta é a religião, que também é educação." (4)

É interessante constatar que Bhagavan Das exprime as mesmas ideias na primeira Conferência Educacional de Toda-Ásia ao declarar que:

"As regras da Religião, isto é, da mais vasta ciência tornam-nos capazes. . . de cumprirmos todas as grandes dívidas e deveres. A religião foi descrita como sendo o mandamento ou a revelação de Deus. Em outros termos, isto significa somente as leis da Natureza de Deus, tais como elas nos são reveladas pelos esforços intelectuais, intuitivos e inspirados, dos videntes e cientistas de todas as religiões e de todas as nações... Ouvimos falar muito tempo das três R's. A quarta, a genuína Religião, é mais importante que todas as outras; mas deve ser a primeira e cuidadosamente descoberta e pensada. Ela apela a todos os educadores, para contribuírem neste trabalho pela aplicação do método científico de descobrir as correlações que há entre as diferenças." (5)

Tanto o Oriente como o Ocidente parecem sentir que um sistema de educação que não conduza realmente o homem desde o mundo das necessidades para a mais vasta consciência das coisas espirituais, falhou na sua missão e não responderá à aspiração intensa da alma humana. Falta muito, num desenvolvimento que faz parar muito cedo o intelecto e ignora a faculdade demonstrada pelas melhores mentalidades de perceber intuitivamente a verdade. Se deixa seus estudantes com mentes fechadas e estáticas, deixa-os também sem equipamento que lhes permita alcançar estes sutis intangíveis "quatro quintos de vida" que o Dr. Wiggam nos diz estarem situados para além do domínio do desenvolvimento científico. Deve-se abrir a porta para os que podem ir além do desenvolvimento acadêmico mental, em relação ao plano de vida físico. O êxito da raça futura está ligado ao êxito destes indivíduos que têm a capacidade de realizar coisas maiores dado que mais espirituais. Estas unidades da família humana devem ser descobertas, encorajadas para ir adiante e penetrar neste reino do intangível. Devem ser cultivados, treinados e uma educação dada, adaptada ao que há neles de mais elevado e de melhor. Tal educação requer uma percepção exata do crescimento, do estado individual, e uma compreensão exata em cada caso da etapa seguinte. Isto necessita de clarividência, simpatia e compreensão da parte do professor.

Há, entre os educadores, uma compreensão crescente desta necessidade de impulsionar os processos educativos mais avançados e, portanto, de elevar os que estão submetidos à sua influência, do domínio do intelecto puramente analítico e crítico, até os planos da razão pura e da percepção intuitiva. Bertrand Russel aponta que "a educação não deve tender para um conhecimento passivo de fatos mortos, mas para uma atividade dirigida para o mundo que os nossos esforços estão criando." Mas devemos recordar que a criação pressupõe um criador vivo e ativo, agindo com intenção e utilizando a imaginação criadora.

Pode-se dizer que os nossos sistemas de educação modernos originam isto? Não é a mente padronizada e mantida baixa pelo nosso sistema de massas e pelo método que consiste em cobrir a memória de fatos mal assimilados?

Se Herbart tem razão quando diz que "a principal função da educação é a revelação ética do universo", então o Dr. Moran tem sem dúvida razão quando sublinha que "uma das causas subjacentes - talvez a maior - à nossa era materialista, é a falta do elemento espiritual na nossa educação formal."

Alguns de entre nós sentem que existe um fim mais vasto ainda que a revelação ética, o que é possível que a humanidade seja a guardiã de uma iluminação e de uma glória que só serão realizadas na sua plenitude quando as massas tenham atingido, numa certa medida, a magnificência que caracterizou as Figuras Mundiais do passado. Não estará isto conforme o desenvolvimento evolutivo, ou seja, que o fim real da educação seja conduzir a humanidade do quarto reino para o reino espiritual, onde os pioneiros que chamamos Místicos e as Figuras determinantes da raça vivem, movem-se e têm o seu ser? Assim, a humanidade será elevada do mundo objetivo para o reino do Espírito, onde se encontram os verdadeiros valores, onde se estabelece o contato com este Eu mais vasto e de que a existência dos "eus" individuais tem por único objetivo revelar. Keyserling faz alusão a isso na seguinte passagem:

"Conhecemos os limites da razão humana; compreendemos o significado dos nossos esforços; somos os mestres da natureza. Podemos examinar simultaneamente o mundo exterior e o mundo interior. Já que podemos determinar cientificamente quais são as nossas intenções reais, não temos a necessidade de sermos mais presa de autodecepções... A partir de agora, esta possibilidade deve tornar-se o motivo consciente da vida. Até aqui não foi assim. Contudo, isto é muito importante porque o centro de consciência determina o ponto de partida do homem. Onde quer que coloque sua ênfase dentro de si, aí fica; e todo o seu Ser é consequentemente organizado... Uma educação para a síntese do entendimento e da ação é necessária, portanto, para uma vida baseada no conhecimento.

Toda a educação, no Oriente, é dirigida para a compreensão sentida que... é o único caminho que pode ser mostrado como conduzindo, a uma elevação da Existência essencial... A coisa essencial não é a informação, mas a compreensão, e a compreensão não pode ser atingida senão pela aplicação criativa pessoal... A percepção sentida significa sempre dar uma significação a uma coisa; a dimensão da Significação encontra-se na direção do interno para o externo. Por conseguinte, o saber, (no sentido de informação) e a compreensão, em realidade, estão na mesma relação que a natureza e o Espírito. A informação é levada do exterior para o interior; a compreensão é um processo criador na direção oposta. Nestas condições, não há caminho direto que conduza de um fim ao outro. Pode-se conhecer tudo e ao mesmo tempo não compreender nada. É precisamente este o impasse para onde a nova educação, que tende a amontoar informações, conduziu a maioria." (6)

Este livro procura tratar do método pelo qual a capacidade de funcionar numa consciência mais larga pode ser desenvolvida e o homem pode reorganizar o seu ser para fins mais vastos. Está ligado com a técnica pelo qual um treino especial e a autocultura podem ser aplicados aos indivíduos que são capazes de desejarem este objetivo mais vasto. Se este desejo assumir uma forma racional e clara na sua mente e for apreciado como um objetivo perfeitamente legítimo e capaz de realizações vitoriosas, ele conseguirá aprendê-la firmemente. Muitos procurarão o caminho agradecidos, se a sociedade providenciar os meios e a oportunidade para tal avanço. O método proposto é uma técnica individual que permitirá ao estudante que aproveitou as experiências da vida e as vantagens dos seus estudos usuais, expandir a consciência até que gradualmente transcenda às suas limitações atuais e reoriente a sua mente para realizações mais amplas. Descobrirá a alma como grandiosa Realidade, ganhando assim experiência direta com as coisas espirituais.

Everett Dean Martin define a educação como uma ''revalorização espiritual da vida humana. A sua tarefa é reorientar o indivíduo, permitir-lhe ter uma visão mais rica e significativa das suas experiências e colocá-lo acima e não dentro do sistema das suas crenças e ideais". (7) Esta definição abre necessariamente a porta à controvérsia, pois vivemos todos em ambientes diferentes. Cada um de nós tem os seus problemas e características especiais, baseados na hereditariedade, na condição física e em muitos outros fatores. O padrão de valores teria assim de ser modificado para cada pessoa, geração, país e raça. Que a educação existe para nos preparar para "viver completamente" (como diz Herbert Spencer) pode ser verdade, mas a forma e a capacidade de cada homem difere. O ponto de realização mais baixo e o mais alto varia infinitamente para os homens e uma certa pessoa preparada para atuar numa esfera particular pode revelar-se ridiculamente inadequada noutra. Deve-se, portanto, delinear algum padrão de "vida completa", se queremos que a definição seja útil. Para fazermos isto temos de descobrir qual o tipo mais puro do homem perfeito e desenvolvido e qual é a soma total da sua gama de contatos. Não parece verdadeiro que tenhamos exaurido as capacidades do aparelho de resposta do homem, nem do ambiente com que pode ser posto em contato. Quais são os limites dentro dos quais cada homem pode atuar? Se há estados de consciência que vão desde o do hotentote até a nossa elite intelectual e mais acima, aos gênios e mestres em todos os domínios da expressão humana, que constitui a diferença entre eles? Por que seus campos de percepção são tão grandemente diversificados? Uns dirão desenvolvimentos sociais, outros estabilidades ou instabilidades glandulares; a posse ou a falta de vantagens educacionais adequadas, de diferenças ambientais e de herança, decidirão ainda outros grupos.

Mas fora da oscilação das opiniões, emerge o fato fundamental humano da vasta escala de estados da consciência humana e o espanto de constatarmos que a humanidade pode produzir maravilhas de pureza de expressão, de compreensão total e de perfeita influência geral, tais como vemos evidenciados por Cristo, Buda, Platão e tantos outros, cujo pensamento e palavras marcaram com o seu selo a mente dos homens para milhares de anos. Quê os fez como eles são? Serão milagres saídos do coração do Infinito e jamais igualáveis? Serão produtos do processo evolutivo e que se tornaram potentes graças a uma vasta experiência e desenvolvimento? Ou são a flor da raça humana, tendo acrescentado ao seu equipamento e treino uma cultura especial, que os tornou capazes de penetrar num mundo espiritual que tem estado fechado à maioria, e de atuar numa dimensão de que os nossos sábios mais esclarecidos nada conhecem? Os atuais sistemas de educação conduziram a humanidade na sua totalidade para uma condição tal que milhares de indivíduos estão prontos para se beneficiar desta cultura especializada e, em consequência, estamos a enfrentar uma crise na educação que tem as suas raízes num acontecimento que, prosseguindo no mesmo sentido, será prejudicial, porque o homem está pronto para alguma coisa nova. Alguns de nós pensamos que isto é possível e que é tempo dos educadores começarem a preparar os homens em vista desta nova divina e maravilhosa experiência, que os porá sempre na posse deles próprios - uma coisa que foi até agora a prerrogativa dos místicos e dos conhecedores. Estes testemunharam um mundo mais vasto do que o revelado pelo mecanismo dos nervos e do que é investigado pelos químicos, físicos, biólogos e antropólogos. Falaram em termos precisos de um domínio de contatos e de percepções no qual os sentidos ordinários são inúteis. Pretendem ter vivido e atuado nessas regiões mais sutis, e a perseverança demonstrada na procura mística da realidade, a similitude dos seus testemunhos através das idades, conduzem-nos a crer na possibilidade deste mundo intangível e na existência de um aparelho de resposta por meio do qual ele pode ser contatado. Estes místicos e estes pensadores intuitivos "enganados” contam-se por dezenas de milhares, entre os melhores intelectos da raça. Dizem-nos como Walt Whitman:

"Eu e os da minha espécie não convencemos por raciocínios, convencemos pela nossa presença." (8)

A educação foi também definida como "uma busca aventurosa da significação da vida, implicando uma capacidade de pensar profundamente as coisas." Não sei quem disse isto, mas parece-me que é uma excelente descrição da maneira dos místicos e da técnica da meditação pela qual o místico se torna conhecedor plenamente consciente. Qualquer que seja o esforço para explicar isto, um fato permanece: o homem vai procurando através das idades, e esta procura leva-o muito mais longe que as coisas concretas e exteriores do mundo no qual ele vive. O Dr. Overstreet atrai a nossa atenção sobre este ponto pelas palavras que encerram a verdadeira mensagem mística. Ele diz:

"Somos, principalmente, criaturas que vemos as "coisas". Vemos o que vemos e geralmente não além do que vemos. Fazer a experiência do mundo apenas como mundo das coisas é perder, sem dúvida nenhuma, algo de significativo. A experiência das coisas, para ser segura, é boa enquanto prossegue. Isto nos torna capazes de andar pelo mundo e de manipular com certo sucesso os fatores da vida... Contudo, é possível alcançar uma "percepção" diferente do seu próprio mundo, se alguém pode desenvolver outro hábito mental. É, em poucas palavras, o hábito de ver o invisível na realidade visível, o hábito de penetrar as superfícies, de ver através das coisas até às fontes originais." (9)

Talvez os homens estejam prontos, agora, para penetrar abaixo da superfície e prosseguir em suas buscas no interior das formas externas da natureza até o que é causa delas. Estamos talvez inclinados a confundir o espírito religioso com a busca mística.

Toda reflexão clara, perseverante, da vida e das grandes leis da natureza, conduz finalmente ao mundo místico, conforme os nossos sábios mais esclarecidos começam hoje a compreender. A religião principia com as hipóteses aceites do invisível e o do domínio místico. Mas a ciência chega ao mesmo ponto procedendo do visível para o invisível, do objetivo para o subjetivo. Assim, como foi dito, pelo processo da investigação e pela passagem de forma a forma, interiormente, o místico alcança finalmente a glória do Eu sem véu. Parece inalterável mente verdade que todos os caminhos levam a Deus, - Deus considerado como fim último, o símbolo da procura humana da Realidade. Já não é um sinal de superstição crer numa dimensão superior e num outro plano da Existência. Mesmo a palavra "sobrenatural" tornou-se profundamente respeitável e parece possível que o sistema educativo considere, qualquer dia, a preparação do indivíduo para ultrapassar os seus limites naturais, como algo que faz legitimamente parte das suas atribuições. É interessante notar o que diz o Dr. C. Lloyd Morgan, nas conferências de Gifford dadas em 1923, sobre a palavra "sobrenatural":

"Há, realmente, um sentido inteligível do qual se pode dizer que na hierarquia ascendente de estados de progresso, considerados como manifestação do Propósito Divino, cada degrau superior é por sua vez sobrenatural em relação ao que o precede. Neste sentido, a vida é sobrenatural ao inorgânico; no domínio do pensamento, a compreensão refletida é sobrenatural em relação ao pensamento ingenuamente irrefletido; altitude religiosa com o reconhecimento do Propósito Divino é sobrenatural em relação à atitude ética nos assuntos sociais. Para os que atingiram este mais alto grau, a atitude religiosa dá o supremo exemplo do sobrenatural. É a característica do homem espiritual." (10)

E o Dr. Morgan acrescenta muito belamente que "o importante para nós reside numa nova atitude, porque é isto, creio, que está a emergir. Assim podemos falar de uma nova "visão" e de um "coração" novo capazes de uma forma de alegria mais elevada e mais rica." (11)

No seu notável livro, "Human Nature and its Remarking" o Dr. Hocking observa que a educação tem duas funções; deve primeiramente comunicar um padrão e depois fornecer o que é necessário para o crescimento para além do próprio padrão. A educação tem por fim fazer o homem verdadeiramente mais humano. Deve delinear e aperfeiçoar a sua natureza e tornar assim possível a revelação das potencialidades profundas para as quais tende a humanidade inteira. A evocação da "vontade-de-conhecer" e mais tarde a da "vontade de ser" devem seguir um processo de desenvolvimento natural. É sob esta relação que o método da meditação revelar-se-á como uma parte da técnica da educação superior que a Nova Era verá desenvolvida; descobrir-se-á que a meditação é o meio pelo qual o ser humano já aperfeiçoado pode sê-lo em grau mais alto ainda, e introduzido num novo reino da natureza. A meditação é em primeiro lugar um processo de educação autoiniciado, convocando toda a força da vontade, baseando-se nos recursos pessoais atuais, mas produzindo afinal um tipo novo de alma, com o seu aparelho interno particular e contendo outra vez em si mesmo os germens de um desenvolvimento ainda maior.

Em vez de ser algo imposto do exterior, o novo processo educativo sai do interior e torna-se a disciplina mental imposta por si mesmo e à qual damos as demonstrações tão pouco compreendidas de: concentração, meditação e contemplação. Em lugar de ser um treino da memória e o desenvolvimento de uma rápida manipulação do aparelho de resposta que nos põe em contato com o meio exterior, a técnica educacional torna-se então um sistema de controle mental, conduzindo finalmente ao conhecimento interno de um novo estado de Ser. Isto, com o tempo, produz uma capacidade de reagir prontamente a um mundo intangível, invisível, e a uma série de cognições instintivas que tem o seu lugar num aparelho de resposta mais sutil. O tipo de alma impõe-se ao tipo humano, como este se impõe ao tipo animal, e do mesmo modo que o tipo humano é o produto do treino das massas e do instinto, tipo que foi prodigiosamente desenvolvido pelos nossos sistemas modernos de educação, da mesma forma, o tipo da alma é o produto de um novo método de treino mental, imposto ao indivíduo pela alma e suscitado pela urgência da busca e pelo ato de sua vontade. Esta alma está sempre latente na forma humana, mas é conduzida para uma atividade real através da prática da meditação.

Esses dois métodos de aperfeiçoamento do homem e sua elevação até um padrão de massa, e a produção da emergência do novo tipo, a alma, constituem a principal distinção entre os métodos educacionais ocidental e oriental.

O contraste entre os dois modos de desenvolvimento é dos mais instrutivos. No Oriente, temos a cultura atenta do indivíduo, as massas são deixadas praticamente sem educação. No ocidente, temos a educação coletiva, mas, geralmente falando, o indivíduo permanece sem qualquer cultura específica. Estes dois grandiosos e divergentes sistemas produziram, cada um, uma civilização que expressa o seu gênio e manifestações particulares, mas também os seus marcantes defeitos. As premissas sobre as quais estes sistemas estão baseados diferem grandemente e é valioso considerá-las porque é na sua compreensão e na sua união final que talvez seja encontrada a solução para a nova raça, na Nova Era.

Primeiro: No sistema oriental assume-se que em toda a forma humana habita uma entidade, um ser chamado Ego ou Alma. Segundo: este Ego utiliza a forma do ser humano como instrumento, ou seu meio de expressão, e manifestar-se-á finalmente, pela soma dos seus estados mentais e emotivos, utilizando o corpo físico como seu mecanismo de funcionamento sobre o plano físico. Finalmente, o controle destes meios de expressão está submetido à lei de Renascimento ou Reencarnação. Pelo processo evolutivo (que prossegue durante numerosas vidas num corpo físico) o Ego constrói gradualmente um instrumento apropriado à manifestação e aprende a dominá-lo. Assim, o Ego ou alma torna-se realmente criativo e autoconsciente no mais alto sentido, ativo no seu meio ambiente, manifestando assim, perfeitamente, a sua natureza verdadeira. Finalmente, ganha a libertação completa da forma, da escravidão da natureza dos desejos e da dominação do intelecto. Esta emancipação final e consequente transferência do centro, da consciência do reino humano para o reino espiritual é apressada e alimentada por uma educação especializada, chamada processo de meditação, que é superimposto a uma mentalidade sábia e largamente cultivada.

O resultado deste treino individual e intenso foi espetacular ao extremo. O método oriental é o único que produziu os Fundadores de todas as religiões, porque todas são de origem asiática. É responsável pelo aparecimento das Escrituras inspiradas do Mundo que moldaram os pensamentos dos homens, pela vinda dos Salvadores Mundiais: Buda, Zoroastro, Sri Krishna, Cristo e outros. Assim, como resultado desta técnica particular, o Oriente produziu todas as Grandes Individualidades que deram a tônica própria para a sua época particular, e o ensinamento necessário para o desenvolvimento da Ideia-de-Deus na mente dos homens, e assim fizeram avançar a humanidade na via da percepção espiritual. O resultado exotérico das suas vidas vê-se nas grandes religiões organizadas.

No treinamento de indivíduos altamente desenvolvidos, contudo, as massas na Ásia foram negligenciadas, e o sistema, em consequência, sob o ângulo de desenvolvimento racial, deixa muito a desejar. O defeito do sistema é o desenvolvimento de tendências visionárias e pouco práticas. O místico é frequentemente incapaz de fazer face às circunstâncias ambientais e quando se insiste unicamente sobre o lado subjetivo da vida, o bem-estar físico do indivíduo e da raça é negligenciado e desdenhado. As massas são abandonadas à luta, na ignorância, doença e imundície, donde estas condições deploráveis que se encontram em todo o Oriente, paralelamente à mais alta iluminação espiritual de uma elite favorecida.

No Ocidente tem lugar o inverso. O subjetivo é ignorado e visto como hipotético e as premissas sobre as quais a nossa cultura se baseia são as seguintes: Primeiro: Há uma entidade chamada ser humano, que possui uma mente, um conjunto de emoções e um aparelho de resposta pelo qual é posto em contato com o ambiente. Segundo: o seu caráter e as suas disposições dependerão do seu aparelho de resposta, da condição do seu intelecto e da natureza das circunstâncias circunvizinhas. O fim dos métodos da educação aplicado em bloco e sem discriminação é torná-lo apto fisicamente, aberto mentalmente, e fornecer-lhe uma memória bem treinada, reações controladas e um caráter que o torne um instrumento social e um fator efetivo no corpo econômico. A sua mente é vista como a reserva onde são armazenados os fatos comunicados e a preparação dada a cada criança tem por fim fazer dela um membro útil da sociedade, decente e autossubsistente. O resultado destas premissas é o oposto do Oriente. Não temos nenhuma cultura específica, suscetível de produzir Figuras Mundiais, tais como as produzidas na Ásia; mas elaboramos um sistema de educação coletiva e desenvolvemos grupos de pensadores. Daí as nossas universidades e escolas públicas ou privadas. Estas imprimem a sua marca sobre milhares de homens, estandardizam-nos, preparam-nos de tal modo que resulta um produto humano, possuindo certo saber uniforme, certa acumulação de fatos estereotipados e uma tintura de informação. Isto significa que não temos já a deplorável ignorância que encontramos na Ásia, mas um nível bastante elevado de conhecimento generalizado. Assim se deu origem ao que chamamos a civilização com as suas riquezas em livros e nas suas numerosas ciências. Isto produziu a investigação científica do homem e (na crista da onda da evolução humana) os grandes Grupos em oposição às grandes Individualidades. Estes contrastes podem ser resumidos, grosso modo, da seguinte maneira:

Ocidente Oriente
Grupos Indivíduos
Livros Bíblias
Conhecimento Sabedoria
Civilização objetiva Cultura subjetiva
Desenvolvimento mecânico Desenvolvimento místico
Padronização Particularismo
Evolução coletiva Treino especializado
Ciência Religião
Desenvolvimento da memória Meditação
Investigação Reflexão

Contudo, a causa é a mesma: um método de educação. Os dois processos são fundamentalmente corretos; não obstante, necessitam completar-se um com o outro. A educação de massas no Oriente conduzirá à retificação dos seus problemas materiais, cuja solução é urgente. Na Ásia um vasto sistema geral de educação, atingindo as massas iletradas, é uma necessidade premente. No Ocidente, a cultura do indivíduo, completada por uma cultura da alma segundo a técnica vinda do Oriente, salvará a nossa civilização, em marcha para a rápida destruição. O Oriente tem necessidade de Saber e de Instrução; o Ocidente tem necessidade de Sabedoria e da técnica de meditação.

Quando este sistema científico e cultural for aplicado aos indivíduos altamente educados, produzirá esse grupo de homens capazes de unificar as realizações do Oriente e do Ocidente e de religar, um ao outro, os domínios subjetivo e objetivo. Agirão como os pioneiros da Nova Era, quando os homens serão práticos homens de negócios, com os pés solidamente apoiados na terra e, ao mesmo tempo, místicos e videntes, vivendo também no mundo do Espírito e suportando com eles, na vida diária, a inspiração e a iluminação.

Para suscitar estas condições e produzir este grupo de místicos que salvará finalmente o mundo, duas coisas são necessárias: mentes treinadas com uma vasta cultura geral servindo de base (e isso o nosso sistema ocidental pode fornecer), mais um conhecimento espiritual da divindade inerente, a alma, a ser alcançado através do sistema oriental da meditação. A nossa grande necessidade, no Ocidente, provém de que nós não reconhecemos a alma e a faculdade da intuição que, por seu turno conduz à iluminação. Na sua notável e sábia obra, o falecido professor Luzzatti, primeiro ministro da Itália, escrevia no Prefácio de seu livro mais valioso e acadêmico"God and Freedom": "Nota-se por toda a parte que o crescente império sobre o próprio homem não avança a par com o império do homem sobre a natureza." É essencial que o mundo ocidental aperfeiçoe os seus sistemas de educação de tal modo que permitem a conquista deste império sobre nós mesmos.

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1. Jones, Rufus M., 'The need for a spiritual element in education", World Unity Magazine, October 1928.
2. Carr, H. Wildon, Philosophy of Change, p.21.
3. Dibblee, Binney George, Instinct and Intuition, p.128.
4. Randall, John Hermann, "Education and Religion" World Unity Magazine, Octo¬ber 1928.
5. Das, Bhagavan, The Unity of Asiatic Thought, i.e. If all Religions.
6. Keyserling, Count Hermann, Creative Understanding, pp. 257, 216-217.
7. Martin, Everett Dean, The Meaning of a Liberai Education, p.VIII, préfacé.
8. Whitman, Walt, Leaves of Grass.
9. Overstreet, H.A., The Enduring Quest, p.114.
10. Morgan, C. Lloyd, Life, MindandSpirit, p.x. Preface.
11. Ibid.
12. Luzzatti, Luigi, God and Freedom.

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