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BHAGAVAD-GITA


CAPÍTULO VI: Dhyana-yoga

Pérola 33. A MENTE COMO AMIGA OU INIMIGA (versos 1 a 9)

1. A Suprema Personalidade de Deus disse: Aquele que não está apegado aos frutos de seu trabalho e que trabalha conforme sua obrigação está na ordem de vida renunciada e é um místico de verdade, e não aquele que não acende nenhum fogo nem cumpre dever algum.

2. Fica sabendo que aquilo que se chama renúncia é o mesmo que yoga, ou união com o Supremo, ó filho de Pandu, pois só pode tornar-se um yogi quem renuncia ao desejo de gozo dos sentidos.

3. Afirma-se que quem é neófito no sistema ióguico óctuplo recorre ao trabalho; mas quem já está elevado em yoga atua através da cessação de todas as atividades materiais.

4. Diz-se que alguém está elevado em yoga quando, tendo renunciado a todos os desejos materiais, não age em troca de gozo dos sentidos nem se ocupa em atividades fruitivas.

5. Com a ajuda de sua mente, a pessoa deve libertar-se, e não degradar-se. A mente é amiga da alma condicionada, e sua inimiga também.

6. Para aquele que conquistou a mente, a mente é o melhor dos amigos; mas para quem fracassou nesse empreendimento, sua mente continuará sendo seu maior inimigo.

7. Quem conquistou a mente já alcançou a Superalma, pois vive com tranquilidade. Para ele, felicidade e tristeza, calor e frio, honra e desonra é tudo o mesmo.

8. Diz-se que alguém está estabelecido em auto-realização e se chama um yogi (ou místico) quando está plenamente satisfeito em virtude do conhecimento e percepção adquiridos. Ele está situado em transcendência e é autocontrolado. Ele vê tudo – seixos, pedras ou ouro – como a mesma coisa.

9. Considera-se que tem maior avanço quem vê benquerentes honestos, benfeitores afetuosos, os neutros, os mediadores, os invejosos, amigos e inimigos, os piedosos e os pecadores – todos com mente igual.

O verdadeiro e último propósito da prática da yoga é unir-se ao Supremo através de bhakti, ou serviço devocional. Porém, até se alcançar bhakti-yoga, o praticante passa por diferentes fases de auto-realização. Este processo de se unir ao Supremo, portanto, pode ser comparado a uma escada com diferentes degraus: karma-yoga, jñana-yoga, dhyana-yoga e bhakti-yoga. Em outras palavras, segundo o Bhagavad-gita, todas estas diferentes yogas são simples meios para, enfim se chegar até bhakti, uma vez que de karma-yoga, até se chegar à bhakti-yoga existe um longo caminho para se percorrer. No Capítulo Três, foi explicado karma-yoga, no Capítulo Quatro, jñana-yoga, e no Capítulo Cinco foi dado uma introdução em bhakti. Agora, aqui no Capítulo Seis, o Senhor irá apresentar o processo conhecido como dhyana-yoga para depois, então, concluir que bhakti é, de fato, o processo mais elevado de todos. Apesar de explicar que dhyana-yoga é um poderoso meio para controlar a mente e os sentidos, o Senhor irá enfatizar que, por agir em consciência de Krishna, a pessoa irá se tornar um yogi perfeito. Em outras palavras, tornar-se um renunciado quando se tem como meta fundir-se no aspecto impessoal de Deus ou praticar yoga simplesmente para alguma satisfação pessoal não constituem as verdadeiras metas da yoga. Portanto, praticar a renúncia do gozo pessoal dos sentidos com o propósito de se ocupar no serviço devocional para o prazer do Senhor é a perfeição da renúncia. Um yogi perfeito age sempre baseado na sua relação amorosa com o Senhor e, por isso, está sempre preocupado em dar prazer ao Senhor. Mas, devido às insuficientes informações acerca do Senhor, um yogi neófito tenta de maneira mecânica controlar sua mente e, fatalmente, acaba caindo vítima de seus desejos pessoais grosseiros e sutis ou até, em raras exceções, espirituais. Isto acontece porque, na prática, ninguém consegue manter-se na condição de inatividade. O processo conhecido como astanga-yoga, portanto, pode ajudar a pessoa a controlar sua mente até um certo ponto e afastá-la do gozo dos sentidos, mas isto não irá resolver por completo o problema da alma condicionada. O Bhagavad-gita enfatiza com frequência que a melhor maneira de livrar uma pessoa dos seus desejos mundanos é ocupar sua mente em consciência de Krishna. Na realidade, a menos que a mente esteja sob controle, a prática da yoga não passa de uma mera exibição, pois a pessoa continuará vivendo com sua pior inimiga dentro de si e, enquanto isto, terá de continuar a servir os ditames da luxúria, cobiça e ira. De maneira diferente, uma pessoa completamente consciente de Krishna permanece sempre ocupando sua mente em pensamentos relacionados com o Senhor e alcança Sua graça divina, tornando-se plenamente satisfeita e autocontrolada. Mas quem não é autocontrolado e não tem a mente tranquila não encontra condições favoráveis para praticar meditação. Por isso, especialmente nesta atual era das trevas, Kali-yuga, quando as pessoas vivem perturbadas por diferentes ansiedades e, por isso, têm grande dificuldade em compreender o que é vida espiritual, enfatiza-se o sankirtana, ou o canto congregacional dos santos nomes do Senhor, Hare Krishna Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare, Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

Pérola 34. AS TÉCNICAS DA DHYANA-YOGA (versos 10-26)

10. O transcendentalista deve sempre ocupar seu corpo, mente e ego em atividades relacionadas com o Supremo; ele deve viver sozinho num lugar isolado e deve sempre ter todo o cuidado de controlar a mente. Ele deve estar livre de desejos e sentimentos de posse.

11-12. Para praticar yoga, é necessário dirigir-se a um lugar isolado e colocar grama kusha no chão e depois cobri-la com pele de veado e pano macio. O assento não deve ser nem muito alto nem muito baixo e deve estar situado num lugar sagrado. O yogi deve então sentar-se nele mui firmemente e praticar yoga para purificar o coração, controlando a mente, os sentidos e as atividades e fixando a mente num único ponto.

13-14. Deve-se manter o corpo, pescoço e cabeça eretos, conservando-os em linha reta, e deve-se olhar fixamente para a ponta do nariz. Assim, com a mente plácida e subjugada, sem medo, livre por completo da vida sexual, deve-se meditar em Mim dentro do coração e ver a Mim como a meta última da vida.

15. Praticando esse constante controle do corpo, da mente e das atividades, o transcendentalista místico, com sua mente regulada, alcança o reino de Deus através da cessação da existência material.

16. Não há possibilidade de alguém tornar-se yogi, ó Arjuna, se come em demasia ou muito pouco, se dorme demais ou não dorme o bastante.

17. Aquele que é regulado em seus hábitos de comer, dormir, divertir-se e trabalhar pode mitigar todas as dores materiais, praticando o sistema de yoga.

18. Quando o yogi, pela prática da yoga, disciplina suas atividades mentais e se situa na transcendência – desprovido de todos os desejos materiais –, diz-se que está bem estabelecido em yoga.

19. Assim como uma candeia não tremula num lugar sem vento, do mesmo modo, o transcendentalista, que tem a mente controlada, permanece sempre fixo em sua meditação no eu transcendental.

20-23. Na etapa de perfeição chamada transe, ou samadhi, a mente abstém-se por completo das atividades mentais materiais pela prática de yoga. Caracteriza esta perfeição o fato de se poder ver o eu com a mente pura e sentir sabor e regozijo no eu. Neste estado jubiloso, o yogi situa-se em felicidade transcendental ilimitada, percebida através de sentidos transcendentais. Nesse caso, ele jamais se afasta da verdade, e, ao obter isto, vê que não há ganho maior. Situando-se nessa posição, ele nunca se deixa abalar, mesmo em meio às maiores dificuldades. Esta é a verdadeira maneira de alguém livrar-se de todas as misérias surgidas do contato material.

24. É necessário ocupar-se na prática de yoga com determinação e fé, e não se desviar do caminho. Devem-se abandonar, sem exceção, todos os desejos materiais nascidos da especulação mental e desse modo controlar com a mente todos os sentidos por todos os lados.

25. Aos poucos, passo a passo, o yogi deve se situar em transe por meio da inteligência alimentada de convicção plena, e assim a mente deve fixar-se no eu apenas e não deve pensar em mais nada.

26. Sempre que a mente divague devido à sua natureza instável e inconstante, deve-se com certeza coibi-la e colocá-la sob o controle do eu.

Aqui, o Senhor explica com clareza que a meta final da yoga é purificar a mente e o coração e encontrar-se com a representação plenária do Senhor que mora dentro de todos nós, a Superalma localizada. Tal prática visa à cessação da existência material e não a alcançar condições materiais favoráveis. Uma vez que o principal dever de um transcendentalista é manter sua mente sempre fixa em Krishna, encontramos aqui diferentes precauções e restrições. Recomenda-se, por exemplo, permanecer em lugares tranquilos para evitar ser perturbado por objetos externos. É necessário observar completa abstinência da vida sexual e, para se alcançar isso, é ideal permanecer em lugares sagrados de peregrinação, como Vrindavana ou Mayapur, onde correm os rios sagrados Yamuna e Ganges. Os exageros nos hábitos físicos de comer e dormir devem ser energicamente evitados e mesmo o trabalho e a diversão devem ser executados de forma regulada. Para evitar as perturbações da mente, deve-se voluntariamente adotar uma vida de autodisciplina e auto-abnegação e abster-se por completo de atividades que incrementam o modo da paixão. Como foi explicado no capítulo anterior, devem-se repelir os objetos dos sentidos, tais como o som, a forma, etc., pela prática da yoga. Se o yogi fica com os olhos completamente fechados, surge a possibilidade de se cair no sono, e se os olhos ficam abertos, há o perigo de se deixar atrair pelos objetos dos sentidos. Desse modo, com as pálpebras semicerradas e com os olhos entre as duas sobrancelhas, o yogi deve concentrar sua visão na ponta do nariz. Dentro das narinas, deve-se restringir o movimento respiratório, neutralizando o ar que sobe e o ar que desce dentro do corpo e assim por diante. Arjuna, no entanto, estava naquele momento no campo de batalha e, como ficará mais claro mais à frente, ele sentia-se incapaz de seguir as técnicas da dhyana-yoga. O Senhor irá acalmá-lo, concluindo que um devoto puro que pensa constantemente em Krishna e está sempre absorto em fazer planos para ocupar tudo no Seu serviço devocional está em verdadeiro samadhi, ou transe, e já alcançou a perfeição da yoga. Mesmo sem ocupar-se na prática mecânica da yoga, o devoto puro perde naturalmente o interesse por coisas materiais desnecessárias e nunca se enreda com falsos sentimentos de posses. Sabendo muito bem que Krishna é o verdadeiro único proprietário, tal devoto nunca se interessa em algo que possa lhe trazer benefícios materiais, mas aceita qualquer coisa que seja favorável no desempenho de seu serviço devocional. Por exemplo, o devoto cozinha pratos saborosos e oferece ao Senhor e depois, com muito prazer, aceita os restos chamados prasadam. Consciente de que a prasadam é um alimento sagrado ou Krishnaizado, o devoto pode gozar a vida sem cair vítima da consciência material. No entanto, mesmo em se tratando de prasadam, o devoto é regulado na quantidade e nos horários, pois ele sabe que, se comer mais do que o necessário, surgirá a tendência de dormir em excesso e, assim, ele irá perder seu tempo precioso numa atividade influenciada pelo modo da ignorância.

Pérola 35. O YOGI E SUA VISÃO DE IGUALDADE (versos 27 a 32)

27. O yogi cuja mente está fixa em Mim alcança deveras a mais elevada perfeição da felicidade transcendental. Ele está além do modo da paixão, percebe sua identidade qualitativa com o Supremo, e assim livra-se de todas as reações a atos passados.

28. Assim, o yogi autocontrolado, constantemente ocupado na prática de yoga, livra-se de toda a contaminação material e alcança a etapa mais elevada – a felicidade perfeita no transcendental serviço amoroso ao Senhor.

29. Um yogi de verdade Me observa em todos os seres e também vê todos os seres em Mim. De fato, a pessoa auto-realizada vê a Mim, o mesmíssimo Senhor Supremo, em toda parte.

30. Aquele que Me vê em toda parte e vê tudo em Mim jamais Me deixa, tampouco eu o deixo.

31. Semelhante yogi, que se ocupa no adorável serviço à Superalma, sabendo que Eu e a Superalma somos um, sempre permanece em Mim em todas as circunstâncias.

32. Yogi perfeito é aquele que, através da comparação com o seu próprio eu, vê a verdadeira igualdade de todos os seres, quer se sintam felizes ou infelizes, ó Arjuna!

O sentimento de que exista algo separado do Senhor chama-se maya ou, em outras palavras: "aquilo que não é". Portanto, deve-se compreender que as diferentes entidades vivas são expansões do Senhor e Suas partes integrantes e se destinam a viver em comunhão com o Senhor. Enquanto está sob o controle da energia material, a entidade viva serve seus sentidos; mas, ao aceitar o controle da energia espiritual, ela passa a servir diretamente o Senhor Supremo. Portanto, um yogi perfeito que adquiriu sua visão espiritual pode ver claramente que, independente da posição que possam ocupar, todas as entidades vivas permanecem servas do Senhor sob todas as circunstâncias. Representando o papel de uma alma condicionada, Arjuna ignorava que a relação corpórea temporária que existia entre ele e seus parentes era infinitamente menos importante do que sua relação espiritual eterna com Krishna. Desse modo, o Senhor bondosamente transmitiu este conhecimento transcendental do Bhagavad-gita não só para Arjuna, mas para que toda entidade viva pudesse recobrar sua consciência espiritual e, de uma vez por todas, livrar-se da ilusão de pensar que pode ser feliz sem prestar serviço amoroso a Deus. De uma maneira ou de outra, ao livrar-se desta contaminação, a entidade viva passa a se interessar pelo serviço devocional e fixa Sua mente nos pés de lótus do Senhor. Nesta posição espiritual segura, o yogi se livra cada vez mais da paixão material e pode perceber sua identidade qualitativa com o Senhor, e atinge a etapa tecnicamente conhecida como brahma-bhuta. Desse modo, ele passa a desfrutar de felicidade transcendental e passa a ver tudo com total clareza. Ele percebe a presença do Senhor no coração de todos os seres vivos, independente das condições materiais nas quais eles se encontram. Compreendendo a natureza transcendental do Senhor, o yogi perfeito sabe que, mesmo estando presente dentro dos cães ou porcos, o Senhor nunca é afetado pela matéria. Com a visão espiritual perfeita, o yogi pode entender a diferença entre a alma individual e a Superalma. A alma individual também está presente individualmente em cada um dos corações, mas a Superalma está presente simultaneamente em todos os corações. Nada, portanto, pode existir sem Krishna e Krishna é o proprietário de tudo. Krishna está em tudo e tudo está em Krishna, mas, ainda assim, Ele permanece em Sua própria morada, desfrutando dos relacionamentos amorosos com Seus associados eternos, os devotos puros. O ser vivo, no entanto, permanece sofrendo imerso na existência material simplesmente porque perdeu sua consciência de Krishna. Compreendendo perfeitamente bem este fato, o yogi perfeito se esforça sinceramente para distribuir este conhecimento espiritual a todos, tornando-se um servo muito querido do Senhor.

Pérola 36. ARJUNA REJEITA A DHYANA-YOGA (versos 33 a 36)

33. Arjuna disse: Ó Madhusudana, o sistema de yoga que resumiste parece-me impraticável e inviável, pois a mente é inquieta e instável.

34. Pois a mente é inquieta, turbulenta, obstinada e muito forte, ó Krishna, e parece-me que subjugá-la é mais difícil do que controlar o vento.

35. O Senhor Sri Krishna disse: Ó poderosíssimo filho de Kunti, é sem dúvida muito difícil refrear a mente inquieta, mas isso é possível pela prática adequada e pelo desapego.

36. Para alguém cuja mente é desenfreada, a auto-realização é tarefa difícil. Mas aquele cuja mente é controlada e que se empenha com meios apropriados com certeza terá sucesso. Esta é a Minha opinião.

Como um homem prático, Arjuna achava muito difícil seguir o sistema de dhyana-yoga apresentado pelo Senhor. No entanto, Arjuna não era uma pessoa comum. Ele era um amigo íntimo de Krishna, pertencia a uma família real e era qualificado como um grande guerreiro. Mesmo sendo dotado de tantas qualidades, ele se recusava a aceitar este sistema de yoga. De fato, deixar o lar e isolar-se nas montanhas com o propósito de regular completamente o modo de vida, inclusive a maneira de sentar-se, a escolha do lugar, o processo de alimentar-se e de dormir, enquanto se tenta afastar da mente todas as ocupações externas, é uma tarefa praticamente impossível. Se, há cinco mil anos, uma pessoa tão qualificada como Arjuna se recusou a praticar esta yoga, que dizer das pessoas comuns que vivem nesta era, a era das trevas? Podemos observar que as pessoas de hoje em dia mal conseguem levar a sério certas práticas espirituais extremamente simples, que dizer então de elas adotarem um sistema de yoga tão complexo e que requer tanta renúncia e auto-abnegação? É claro que podem existir raríssimas exceções, mas para as pessoas em geral a dhyana-yoga é um empreendimento impossível. Esta dificuldade existe especialmente devido à obstinação da mente, a qual muitas vezes tem a força de sobrepujar até a inteligência. Arjuna, portanto, não se identificava com um sistema de yoga tão inviável. Ele está representando o papel do homem moderno que tem de enfrentar o mundo e viver seu próprio cotidiano.

Tal qual Arjuna, o Senhor concordou que, especialmente para esta era, ninguém consegue seguir tantas regras e regulações tão estritas e, portanto, ofereceu a Arjuna (e a todos nós) um tratamento adequado para a mente obstinada: deve-se praticar a consciência de Krishna segundo a própria natureza. Isto irá nos livrar gradualmente de todos os desejos materiais. Em outras palavras, perfeição da yoga significa livrar-se por completo da existência material; semelhante perfeição não se caracteriza como sendo um ato de mágica ou ginástica para se enganar o povo inocente e obter algum lucro material.

Pérola 37. O DESTINO DO YOGI MALSUCEDIDO (versos 37 a 47)

37. Arjuna disse: Ó Krishna, qual é o destino do transcendentalista malogrado, que no começo adota com fé o processo da auto-realização, mas que mais tarde desiste devido à mentalidade mundana e desse modo acaba não alcançando a perfeição no misticismo?

38. Ó Krishna de braços poderosos, será que semelhante homem, que se afasta do caminho da transcendência, não estraga seu sucesso espiritual e material e sucumbe como uma nuvem destroçada, sem nenhuma posição em esfera alguma?

39. Esta é a minha dúvida, ó Krishna, e peço-Te que a suprimas por completo. À exceção de Ti, não se pode encontrar ninguém que possa dirimir esta dúvida.

40. A Suprema Personalidade de Deus disse: Filho de Pritha, um transcendentalista ocupado em atividades auspiciosas não sofre destruição nem neste mundo nem no mundo espiritual; quem faz o bem, Meu amigo, jamais é vencido pelo mal.

41. Após muitos e muitos anos de gozo nos planetas habitados por entidades vivas piedosas, o yogi malogrado nasce numa família de pessoas virtuosas ou numa família de rica aristocracia.

42. Ou (se fracassa após longa prática de yoga) ele nasce numa família de transcendentalistas que com certeza têm muita sabedoria. É claro que semelhante nascimento é raro neste mundo.

43. Obtendo esse nascimento, ele revive a consciência divina de sua vida anterior e volta a tentar o prosseguimento do seu avanço para conseguir sucesso completo, ó filho de Kuru.

44. Em virtude da consciência divina de sua vida anterior, ele automaticamente sente-se atraído aos princípios ióguicos – mesmo sem procurá-los. Esse transcendentalista inquisitivo sempre fica acima dos princípios ritualísticos das escrituras.

45. E quando com esforço sincero o yogi ocupa-se em continuar progredindo, limpando-se de todas as contaminações, então afinal atinge a meta suprema, alcançando a perfeição depois de praticar durante muitos e muitos nascimentos.

46. Um yogi é maior do que o asceta, maior do que o empirista e maior do que o trabalhador fruitivo. Portanto, ó Arjuna, em todas as circunstâncias, sê um yogi.

47. E de todos os yogis, aquele que tem muita fé e sempre se refugia em Mim, pensa em Mim dentro de si mesmo e Me presta transcendental serviço amoroso – é o mais intimamente unido a Mim em yoga e é o mais elevado de todos. Esta é a Minha opinião.

Apesar de, anteriormente, ter ouvido de Krishna que a bhakti-yoga é superior e que um pequeno esforço neste caminho pode dar uma grande esperança de liberação, Arjuna queria assegurar-se ainda mais sobre este tema e pediu a Krishna que confirmasse esta declaração. Por estar seduzida pela energia material ilusória, mesmo executando disciplinas espirituais, a possibilidade de a entidade viva voltar a cair em suas garras sempre existe e Arjuna está curioso de saber o que é que se reserva para tal transcendentalista malogrado. A verdade é que, ao trilhar o caminho espiritual, a pessoa está declarando guerra contra maya. Como consequência, ao tentar escapar das garras da energia ilusória, a pessoa provavelmente terá de se defrontar com diferentes armadilhas preparadas especialmente para derrotá-la. Em resposta a esta questão, o Senhor garantiu que o transcendentalista malsucedido não precisa se preocupar, pois ele nunca sairá perdendo. Se ele cai após um curto período de prática, irá para os planetas celestiais e poderá conviver com muitas pessoas piedosas. Depois de viver lá por um longo período, ele voltará a este planeta, quando nascerá numa família de pessoas piedosas ou de mercadores aristocratas. Desse modo, ele poderá tirar proveito dessas condições favoráveis e continuar sua elevação espiritual. Se, no entanto, o transcendentalista fracassar depois de longo período de prática, ele irá nascer diretamente numa família de grandes transcendentalistas. Neste caso, para uma criança nascida numa família com grande sabedoria, seu ímpeto espiritual surgirá desde o começo de sua vida. Tal nascimento é altamente louvável e é considerado muito raro. Devemos compreender, portanto, que qualquer esforço que a pessoa empreender no caminho espiritual nunca será em vão. Ela sempre atrairá a misericórdia do Senhor, que lhe dará repetidas oportunidades para ajudá-la a conseguir a completa perfeição em yoga, ou em outras palavras, alcançar a perfeição em consciência de Krishna.

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