A Simplicidade no Caminho para a Alma e o Espírito
Philippe Robert

Temos aqui um tema que, à primeira vista, pode parecer dizer: "simplicidade, é muito simples de ser interessante!" No entanto, não é tão óbvio ao abordar este assunto. Somos convidados a permanecer simples para que a abordagem, que fazemos dela, seja a tradutora de sua mensagem. Tomando isso como ponto de partida, uma pesquisa de várias fontes, diz-nos, em primeiro lugar, na Bíblia em Mateus X versículo 16:

"Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas."

Com relação ao símbolo da pomba o dicionário diz: "Em todo o simbolismo judaico-cristão, a pomba - que, no Novo Testamento, representa o Espírito Santo - é basicamente um símbolo de pureza, de simplicidade, e quando traz um ramo de oliveira para a Arca de Noé, um símbolo de paz, harmonia, esperança, felicidade reencontrada. Como a maioria das representações de animais alados na mesma época cultural, foi dito que era a sublimação do instinto e, especificamente, de Eros".

Vejamos, agora, no Bhagavad-Gita, que no capítulo XVI versículo 1-3 nos diz: "A Suprema Personalidade de Deus disse: Destemor, purificação da própria existência; cultivo de conhecimento espiritual; caridade; autocontrole; execução de sacrifícios; estudo dos Vedas; austeridade; simplicidade; não violência; veracidade; estar livre da ira; renúncia; tranquilidade; não gostar de achar defeitos; compaixão para com todas as entidades vivas; estar livre da cobiça; gentileza; modéstia; firme determinação; vigor; clemência; fortaleza; limpeza, estar livre da inveja e da paixão pela honra – estas qualidades transcendentais, ó filho de Bharata, existem nos homens piedosos dotados de natureza divina."

Como queríamos pesquisar em várias direções, olhamos de relance as cartas dos Anjos com a intenção de ver se a palavra "simplicidade" seria encontrada lá. Abrindo o pequeno livro que acompanha o jogo em uma página aleatória, o termo pesquisado surgiu espontaneamente, dizendo o seguinte: "Seja apenas você mesmo. Veja além das distrações e dramas em curso. Tire um tempo para esclarecer o que é importante para você, e tire da mente o que não é."

Krishnamurti nos diz: "A simplicidade do coração tem muito mais importância e significado do que a simplicidade das posses. Contentar-se com poucas coisas é uma questão relativamente fácil. Renunciar ao conforto, ou abrir mão de fumar e outros hábitos, não indica simplicidade de coração. Vestir tanga em um mundo acostumado com roupas, confortos e distrações, não indica um ser livre. (...) Você mede o progresso de sua realização de acordo com os padrões de virtude: como você desistiu disto ou daquilo, como você tem controlado seu comportamento, como tolerante e bondoso você tem sido, e assim por diante. Aprendeu a arte da concentração, retira-se para uma floresta, um mosteiro ou uma sala escura para meditar; passa seus dias em oração e vigilância. Aparentemente você tornou a sua vida simples, e através deste arranjo pensativo e calculado você espera alcançar a bem-aventurança que não é deste mundo. (...) Todos os meios e fins são uma forma de apego, e devem cessar diante da realidade".

Depois de ler estas apresentações da simplicidade e do papel que desempenha no caminho da Alma e do Espírito, é apropriado dizer que a nossa intenção não é aprofundar a análise de textos, que são ricos o suficiente para encher muitos volumes para reflexão. Tentar encontrar um tema comum dessas apresentações da verdade, no entanto, evoca outra palavra para confirmar ou expressar simplicidade de outra forma: a palavra despojamento! Krishnamurti, em seu próprio estilo, sugere-nos não medir esforços para realizá-lo. E pondera: o que resta como meio para aproximarmos da simplicidade? Não se enganem, esta pessoa ilustre meditou por horas a cada dia, fosse dia ou noite, internamente ou não, então...?

Tentemos levar em consideração o ministério do Cristo há pouco mais de dois mil anos atrás.

Um estudo profundo dos textos bíblicos revela uma descrição do Cristo como extremamente humilde, despretensioso, sem posses desnecessárias, sem pompa que poderia ser encontrada em alguns membros do clero da época. O que também destaca é que, especialmente em eventos importantes da sua encarnação, o Nascimento, o Batismo no Jordão, a tentação no deserto, a Transfiguração, Crucificação, ou a Ressurreição, houve uma simplicidade. Ele é descrito como nascido em extrema pobreza, despoja-se de suas vestes como um véu material antes de entrar nas águas do batismo, isola-se - rapidamente - no deserto antes da tentação, retira-se em uma montanha, levando consigo apenas três discípulos; na crucificação é dito ter sido abandonado por todos, despojado de suas roupas e, finalmente, despojado da vestidura de seu corpo físico pela morte, a ressurreição vindo como a sublimação da simplicidade através da união com o Pai ou o Espírito. A simplicidade é inseparável da vida do Cristo, Ele é esta simplicidade. Justamente, então, podemos perguntar:" ... mas por que é tão difícil de ser alcançada?" E a resposta vem: porque o homem em sua personalidade é complicado!

Paradoxalmente, é difícil para o ser humano, como indivíduos, grupos, nações e o mundo, livrar-se daquilo com o qual falsamente se identifica através de suas miragens e ilusões. Se alguém observar um pouco a si mesmo pode ver, certamente, o quão complicado somos, intricados com as "especialidades" específicas de cada um, de acordo com os Raios que regem nossas personalidades. Quando meditamos, por definição, há observação e, portanto, vemos nesse momento com que intensidade o fluxo de pensamentos e emoções do momento, das situações vividas no cotidiano, poluem a simplicidade com que a Alma e o Espírito estão nos chamando. Na verdade, este padrão se repete a cada dia, em meditação após meditação, mas não é fixo, pois caso contrário, significaria que não há evolução. Isto dá a impressão que, no processo meditativo, há um pouco, em certa medida, do ministério do Cristo em si mesmo, conduzindo da dissipação e dispersão, no início da meditação, a uma purificação progressiva, aqui também, como renúncia, como remoção do supérfluo para encontrar a grande simplicidade interior. Os tibetanos têm um ditado que diz: "... é como um copo cheio de água turva. Gradualmente, os elementos mais grosseiros e mais pesados são depositados na parte inferior do copo, e os menores permanecem. Então, a água torna-se transparente, já que é de sua própria natureza."

Sim, durante a meditação há, como temos visto, um momento em que a pessoa se sente levada pela dispersão. Mas também existe, por meio de observação, o reconhecimento do fenômeno desaparecendo. Quer seja em meditação ou em atividade durante o dia, pensando, escrevendo, etc... Quando esse movimento de observação vem, e com ele a consciência do que estou fazendo nesse momento, se a tensão está envolvida neste processo, há uma bloqueio do processo em curso, como se parte da personalidade e a sua atividade fossem incapazes de funcionar ao mesmo tempo como a consciência.

Na meditação, esse estágio abre as portas para um grande silêncio interior, um ponto de encontro entre a tensão resultante do desprendimento e a união com o grupo. Na verdade, sente-se quase automaticamente que a estrutura desse silêncio interior e a união com o grupo são uma só coisa. É como uma luz ofuscante, porque plena de uma nova compreensão. Há, em seguida, ou simultaneamente, uma grande Presença. A impressão é que Ela estava sempre ali, mas para torná-la real é preciso... Simplicidade. Simplicidade e a presença do Mestre Interior, como foi com Cristo através de seu ministério na Palestina, pouco mais de dois mil anos atrás! Vamos repetir essas palavras novamente, que envolvem uma realidade tão importante: Simplicidade, Silêncio Interior, Desprendimento, uma Grande Presença!

Em um ensinamento espiritual intitulado "A Vida Impessoal" se diz: "Não busque outra coisa senão o Eterno Presente." Se, mais uma vez, limparmos estas últimas palavras do que é supérfluo, se de fato houver, a única palavra que resta, é "SER". Este é o lugar onde o lado complicado da personalidade, mencionado acima, revela como se identifica com o passado, o que representa toda a diferença com o Presente desejado. Na Escola Arcana, como estudantes, recebemos a cada ano os cursos seguintes com um novo esquema de meditação. Então há por parte do aluno, certamente, a preocupação de atuar bem, meditar corretamente! Mas há a etapa em que se deve retirar da mesma este esquema. Isso não significa meditar sem ele, mas saber quando tirá-lo da mente quando a inspiração surge, deixando a alma assumir. É como um trampolim do qual você precisa saber quando sair no final do empuxo, a fim de decolar! Se alguém permanece congelado, cristalizado sobre como pronunciar um Mantra por exemplo, fica em uma projeção do pequeno eu e não se deixa alçar voo ou entrar no vácuo causado pela vibração do Mantra. A este nível, a Simplicidade exige Desprendimento, deixando, desta forma, o silêncio revelador interior intervir e, por sua vez, a Grande Presença.

Na meditação de hoje sobre o Reaparecimento do Cristo, há um convite mântrico: "Esquecendo-me das coisas do passado, me esforçarei até as minhas possibilidades espirituais mais elevadas." E então a personalidade reage, geralmente desenvolvendo muito rapidamente a dúvida e o medo, perguntando: "Mas, se a memória é sacrificada, vou me perder." O medo é um adversário formidável em conexão com o desejo e, portanto, uma parte da Miragem individual e do mundo. Mas Cristo nos chama, por meio do episódio do jovem rico do Novo Testamento, para aliviar-nos firmemente dessas cargas, quando ele disse: "Vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me." Parece haver aqui um paradoxo: fundir-se com a Alma e o Espírito, que são um em simplicidade, existe a dificuldade de desistir do labirinto tortuoso das emoções e da mente concreta!

Há também uma nota cheia de esperança neste caminho; ousemos entrar nela, ousemos despojar o supérfluo, o que TS Eliot descreveu como "Um estado de extrema simplicidade cujo preço a pagar é nada menos que o todo".

Finalmente, algumas palavras do Tibetano : "O neófito sabe que o objetivo do ocultista é trabalhar com as forças. Ele ignora, no entanto, que isto não pode ser feito conscientemente até que ele tenha sido por um longo tempo simplesmente um canal. Eu gostaria que refletissem sobre esse pensamento."

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Alocução feita na Conferência da Escola Arcana - Genebra
Maio de 2013

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