Regras do Caminho
(...) deixa-se o mirante com a sensação que algo novo acontece. O relâmpago, noturno, quando ocorre nas nuvens mais altas, além de riscar o céu, enche a noite com uma luz difusa e abrangente. Na mente do caminhante essa luz ilumina-se e ele, atento, percebe a cena:
Então, “Diante do trono de Deus, a Alma - e as demais almas - se apresentaram e exclamaram: Senhor de minha Vida! Concedei-me a fortaleza para trilhar o Caminho da Revelação, cruzar o mar da negra ilusão e enfrentar o caminho iluminado da terra. Deus respondeu: Vades, e vades muito longe”.
Mas, “Diante do portal que se abre sobre o “Caminho Iluminado”, a alma permaneceu só e disse: Senhor de minha Vida! O Caminho da Revelação é o caminho da vida manifestada; o caminho da negra ilusão conduz à glória do sol nascente; o caminho iluminado da terra conduz à Luz que dispersa toda sombra. Procuro trilhar o “Caminho Iluminado” que conduz de volta à TUA PRESENÇA. Entretanto, esse Caminho é obscuro. Que devo fazer? Deus respondeu: Aproxima-te e penetra na tua própria luz e nessa luz verás a luz”.
Assim então, “Diante do portal de cada novo dia que contém em si as horas ordenadas de responsabilidade, eu permaneço. Exclamo em voz alta: Senhor de minha Vida! Como posso cumprir com o dever deste dia, procurando sempre conseguir o desapego, satisfazer todas as necessidades e também livrar-me das amarras e dos compromissos? Deus respondeu: O sol se aproxima e vivifica a terra e nada se pode levar da terra. Vive como ele. Dá e não peças nada”.
... a luz se dissipa. O caminhante torna-se pensativo e, na busca, recebe as Regras do Caminho:
“I – O Caminho é trilhado em plena luz do dia, direcionada sobre a Senda por Aqueles Que sabem e lideram. Nada pode ser escondido, e a cada volta, o viajante deve confrontar-se consigo mesmo.
II – No Caminho o escondido é revelado. Cada um vê e sabe a vileza de cada outro. E no entanto, com essa grande revelação, não há retorno, não há rejeição de uns aos outros, e não há debilidade no Caminho. O Caminho avança dia adentro.
III – Ninguém vagueia perdido no Caminho. Não há afobação nem pressa. E no entanto, não há tempo a perder. Cada Peregrino, sabendo disso, apressa os passos e se encontra rodeado por seus companheiros. Alguns se adiantam; ele os segue. Alguns se atrasam; ele determina o ritmo. Ele não viaja sozinho.
IV – Três coisas o Peregrino deve evitar. Usar um capuz, a máscara que encobre seu rosto dos outros; levar um pote com água somente para suas próprias necessidades; carregar nos ombros um cajado sem um gancho para segurar.
V – Cada Peregrino na Senda deve carregar consigo aquilo que ele precisa: um braseiro, para aquecer seus companheiros; uma lanterna, para iluminar seu coração e mostrar aos seus companheiros a natureza de sua vida oculta; uma bolsa com ouro, que ele não esbanja no Caminho, mas divide com os outros; um vaso lacrado, onde ele leva todas as suas aspirações para depositar nos pés Daquele Que aguarda para recebê-lo no portão – um vaso lacrado.
VI – O Peregrino, à medida que percorre o Caminho, deve ter o ouvido aberto, a mão generosa, a língua silenciosa, o coração purificado, a voz suave, o passo rápido, e o olho aberto para ver a luz. Ele sabe que não viaja sozinho.”
Contemplando o horizonte aberto que se perde de vista, o caminhante, que também se perde em seus pensamentos, é admoestado.
Entretanto, “não procure, Oh duas vezes abençoado, alcançar a essência espiritual antes que a mente a absorva. Não é assim que se procura a sabedoria. Somente àquele que tem a mente sob controle e vê o mundo como espelho pode merecer confiança de maneira segura com o senso interno...
O caminho que é trilhado pelo servidor é o caminho do fogo que passa através de seu coração e conduz para a cabeça. Não é no caminho do prazer, nem no caminho do sofrimento que a libertação pode ser alcançada ou que a sabedoria chega. É pela transcendência dos dois, pela fusão da dor com o prazer que a meta é alcançada, aquela meta que jaz adiante, como um ponto de luz visto na escuridão de uma noite de inverno. Aquele ponto de luz pode chamar à mente a minúscula vela em algum sombrio sótão, mas, como o caminho que conduz àquela luz é trilhado através da fusão do par de opostos, aquele fino ponto frio e tremeluzente cresce com firme irradiação até que a luz quente de alguma lâmpada brilhante venha à mente daquele que erra pelo caminho.
Prossiga, Ó Peregrino, com firme perseverança. Nenhuma luz de vela há lá nem lâmpada da terra alimentada com óleo. Sempre a irradiação cresce até que o caminho termine num brilho de glória, e o ser errante através da noite se torne a criança do sol, e entre nos portais daquela radiante orbe.”
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JCB - anotações: O Caminho Real