Cristianismo Esotérico
Prof. Tânia Gonçalves de Araújo
Uma das maneiras de se compreender o Cristianismo Esotérico baseia-se na percepção que a humanidade vem tendo do Cristo ao longo dos séculos. Há três formas do Cristo ser percebido pelo homem:
- O Cristo Histórico — que segue o fio da história dos acontecimentos
físicos da vida do Mestre;
- O Cristo Mítico — que segue o fio legendário;
- O Cristo Místico — que segue o caminho mais interno.
As três formas contribuem para a compreensão da figura grandiosa do Salvador, mas a terceira, isto é, o Cristo Místico é a mais ligada ao Cristianismo Esotérico e diz muito sobre a evolução de cada um de nós.
O CRISTO HISTÓRICO
É a vida de Jesus na Terra, a sua vida na carne.
É o Jesus Curador e Instrutor que nasceu de uma família pobre; foi instruído
nas escrituras hebraicas; revelou extraordinária inteligência ante os
doutores da Lei, em Jerusalém; pelo seu fervor religioso foi enviado para ser
educado na comunidade essênia; teve contato com sábios da Pérsia e das
Índias; esteve no Egito onde leu, na Biblioteca de Alexandria, obras da Escola
Transhimalaia.
Viveu durante 29 anos uma existência mortal, crescendo em graça, pureza e
fervor religioso excepcionais, tornando-se um discípulo digno de servir de
templo a uma Presença Grandiosa que daria um novo impulso evolutivo à
humanidade; foi o Instrutor Supremo, cheio de graça e verdade (Cartas de João
I, 14), o Verbo feito carne e uma fonte de vida.
A partir do Batismo, quando sobre ele desceu o raio do espírito sob a forma de
uma pomba branca, inicia sua vida messiânica, ensinando as multidões por
parábolas, e, pela força do espírito puro curava pela palavra e pelo contato
magnético de seu corpo cheio de energia divina.
O Cristo histórico é, portanto, um Ser glorioso pertencente à Hierarquia
Espiritual que dirige a evolução da humanidade. Foi morto por blasfêmia, por
ter ensinado que a divindade habitava nele como em todos os seres humanos.
O CRISTO MÍTICO
Em torno da gloriosa figura de Jesus estão os mitos que o ligam a seus
predecessores; estes mitos ensinam, em forma alegórica, a trajetória de seres
semelhantes a Jesus, pois simbolizam a ação do Logos no Universo e a
evolução superior da alma humana.
Alice Bailey define mito como uma crença sintetizada e um conhecimento do
passado, transmitido com o fim de guiar-nos e estabelecer os fundamentos de uma
revelação mais nova, formando os degraus que conduzem à verdade seguinte. Os
mitos nos trazem, portanto, a continuidade da revelação.
Neste sentido, o cristianismo tem inúmeros pontos de contato com religiões
mais antigas e as festividades comemorativas de acontecimentos da vida de Jesus
recordam outros instrutores.
O mito pode ser visto como uma alegoria que traduz verdades internas. O Cristo
Mítico é o Cristo dos mitos ou lendas solares que deram ao mundo verdades
profundas demonstrando que “O que está em cima é como o que está
embaixo”.
O Mito Solar é uma narração onde aparece, em primeiro lugar, a atividade do
Logos ou Verbo no Cosmos e, a seguir, os fatos da vida de um Ser que é a
encarnação do Logos. O Ensinamento nos diz que no princípio era o Verbo, a
palavra criadora, e que nosso Sistema Solar foi edificado, segundo princípios
admiráveis, e certos seres personificam esses princípios, ensinando-nos pelas
suas ações as Leis do universo e do homem.
O herói do mito é geralmente um Deus ou semideus que tem sua carreira guiada
pelo curso do Sol que é a representação do Logos. O herói nasce no
solstício do inverno, à meia-noite do dia 24 de dezembro — a noite mais
longa do ano, quando o signo de Virgem se eleva no firmamento — e morre no
equinócio da primavera — quando os dias são mais longos e as noites mais
curtas.
Estas datas são um símbolo — o Salvador vem na maior noite do ano quando a
humanidade está envolta nas trevas, nas crises e dificuldades como naquela
época estava o povo hebreu e atualmente a humanidade o que nos leva a invocar
o Cristo na certeza que Ele virá. O Salvador sempre traz a luz nas épocas de
treva “Sempre que houver um debilitamento da lei, Eu volto a nascer, idade
após idade”.
O Salvador faz a sua passagem para o Mundo Divino no equinócio da primavera,
estando o signo de Áries, o Cordeiro, ligado à crucificação. O Mestre Jesus
foi crucificado na ocasião da Quaresma que é seguida da Páscoa quando os
dias são mais longos, estando a Terra mais iluminada não só fisicamente, mas
também espiritualmente graças ao jorro de luz enviado pelo Cristo na
ascensão.
Os livros esotéricos dão uma infinidade de coincidências de acontecimentos
da vida de Jesus e de outros seres iluminados, como por exemplo: O nascimento
de Jesus apresenta fatos análogos ao de Mitras e de Horus; a Isis egípcia tem
semelhança com Maria, de Belém, sendo ambas conhecidas como Nossa Senhora
Imaculada, a Mãe de Deus e, em certos desenhos antigos, a Virgem do Zodíaco
era representada por uma mulher amamentando uma criança, tipo característico
de todas as Madonas.
Os mitos solares se repetem através das idades com nomes diferentes, mas
sempre simbolizando o ser divino. No caso da vida de Jesus, as narrações se
referem em termos profundos, ao Cristo Universal — o homem simbolizando o Ser
Divino (a cruz dentro do círculo). Jesus era o Filho do Homem e o Cristo do
Mito Solar era o Filho de Deus, o Cristo dos Mistérios e, no Cristo mítico
encontra-se o segredo do Cristo místico.
O CRISTO MÍSTICO
Este é o sentido mais profundo da história do Cristo e diz respeito a como
o homem realiza em si mesmo o mistério do Cristo Mítico. O Logos (o
organizador) desce ao seio da matéria e por isso o seu símbolo é o Deus-Sol.
O Sol físico é o seu corpo e Deus é muitas vezes chamado o que habita o Sol.
As filosofias e religiões derivam-se do culto ao Sol e das ideias deste culto
sobre a vida, o amor e a existência. Todas se organizam no culto à força
sustentadora do universo, entretanto, além de cultuá–La, cabe ao homem
desenvolver esta força dentro de si mesmo para que a conheça e possa fazer
uso dela.
Assim como no universo ou macrocosmo, o Cristo dos Mistérios representa o
Logos, ou a 2ª pessoa da Trindade, no homem, Ele representa o segundo aspecto
do Espírito Divino, chamado o “Cristo”, o ungido, o consagrado, o
Salvador.
O Cristo Místico é, portanto duplo: o Logos que desce à matéria e lhe dá
forma pela Palavra ou Verbo: “No princípio era o Verbo... Todas as coisas
foram feitas por Ele e nada foi feito sem Ele”. Temos também o Amor ou o 2º
aspecto do Espírito Divino evoluindo no homem. O primeiro representa os
processos cósmicos, o outro o processo que se passa no indivíduo, sendo a
última fase de sua evolução e, ao ultrapassá-la, o ser humano torna-se um
Mestre de Sabedoria.
Este ato é a Cristificação ou Cristianização que os dicionários dizem ser
o efeito de cristianizar ou cristianizar-se — prefiro este último, o verbo
com a partícula reflexiva “se” indicativa de algo que não pode ser
imposto. Cada qual realiza a própria Cristificação desenvolvendo sua vontade
e trabalhando em espírito. Gradualmente o homem aprende a conhecer a mente e
sabe que esta gera poder e tem força criadora. Aprende que ele é o mecânico
que tem o dínamo (a mente) a seu cargo. Concentra sua mente na construção do
templo da alma e a edifica dia após dia, pensamento após pensamento. Este
templo é criado com os pensamentos puros, e os pensamentos são criadores do
caráter e modificam nossa conduta pessoal.
Com a prática de pensar e viver corretamente, o estudante vai se ajustando ao
ponto de vista espiritual. A prática aumenta o conhecimento de como obter o
fluxo de vida, luz e poder que lhe vem do Alto, ganhando poder espiritual; usa
esse saber na vida do dia-a-dia e aprende que é um ser divino como os demais
companheiros de jornada e, portanto, portador dos poderes do Pai. Morya diz
“A recepção de um pensamento vindo do Infinito é uma afirmação do homem
como um Ser espiritualizado, um mensageiro, um guardião da luz. Eu afirmo que
o pensamento flui do Infinito de forma compreensível”.
Nossas práticas de meditação dizem que devemos manter a mente aberta às
impressões vindas do Mundo Superior e, uma vez recebidas devemos deixá-las
impressionar a substância mental inferior e formular pensamentos-forma
práticos que serão usados no mundo e na nossa vida. Isso é uma forma de
Serviço advinda do Cristianismo Esotérico. Em Morya lemos “O pensamento
circulando no amplificador do Infinito, purifica-se e assim exaltado retorna
aos mundos manifestados e pode ser observado pela sensibilidade humana: às
vezes como uma teia de aranha sobre a face, às vezes sente-se um toque ou um
chamado inaudível a outros. São inúmeras as formas de percepção. O homem
deve habituar-se aos novos níveis de consciência e de percepção que o
conduzem a mais vastos campos de serviço”.
O apóstolo João começa seu evangelho falando sobre o Verbo (ou a Palavra) e
o Dr. Clymer em seu livro Cristificação diz que “o Verbo é um fogo do
céu. Vem do Pai. É Vida. É luz que ilumina a todo homem que vem ao
mundo-carne-corpo. Se não aceita essa luz ele fracassa no mundo espiritual e
no físico. O verdadeiro êxito depende sempre destes dois planos e a
verdadeira religião pertence aos dois planos, cabendo ao homem realizar a
Vontade de Deus aqui na Terra”.
Alice Bailey afirma que o homem, o ser autoconsciente, difere dos demais reinos
da natureza por poder avançar na onda da vida de Deus em plena consciência.
Lança uma ponte entre o reino em que se encontra e o novo horizonte, pela
construção do antahkarana. Os seres humanos são cidadãos de ambos os reinos
— o humano e o espiritual — e o Cristo demonstrou essa dupla cidadania pois
era o Filho do Homem e o Filho de Deus. Que benefícios tem um homem com dupla
cidadania: por exemplo, brasileira e portuguesa? Ele goza de todos os direitos
de transitar e viver nos dois países, sem restrição alguma. O mesmo ocorre
quando aprendemos a gozar nossa cidadania divina: Agimos com a mesma
desenvoltura no mundo material e no espiritual.
Agora é um tempo de crise em que todos os seres humanos são necessários.
Cabe ao estudante dar um impulso mental na direção da clareza de pensamento
que o transformará de aspirante bem intencionado em discípulo de clara
visão, animado por um espírito de amor e boa vontade para com todos os
homens, sem restrições de raça, credo ou cor.
Atualmente muito se fala sobre o Reaparecimento do Cristo e isto depende da
Cristificação quando se emprega a Vontade para o desenvolvimento do Amor
expressando-se nas virtudes cristãs ou qualidades ardentes que juntamente com
a Inteligência Ativa ou Adaptabilidade permitem ao homem permanecer no Centro
da Tríade Espiritual.
Nossa concentração nestes três aspectos divinos — Vontade, Amor e
Adaptabilidade — permite a iluminação da alma e a regeneração do corpo. O
estudante sabe que o verdadeiro desenvolvimento é triplo: Os corpos e a mente
se alinham e obedecem ao comando da alma.
Lembremos sempre que a verdadeira regeneração da vida é o resultado do
desenvolvimento espiritual, por isso o Mestre ensinou: “Busca primeiro o
reino de Deus e sua justiça e tudo o mais lhe será dado por acréscimo”.
Esse trabalho de construção do indivíduo é o Cristianismo Esotérico.
BIBLIOGRAFIA:
Cristificacion – Dr. Clymer
Cristianismo Esotérico – Anne Besant
De Belém ao Calvário – Alice A. Bailey
AUM – Helena Roerich (§ 14 e 17)